A concepção do processo ensino-aprendizagem e a percepção dos resultados. Análise das (in)congruências ao nível das orientações epistemológicas

(resultados comparativos numa amostra de professores de Português, Matemática e Inglês)


Ana Paula Couceiro Figueira



Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra
(Brasil)


Resumo

Pretende divulgar-se parte dos resultados obtidos numa investigação realizada com professores de três áreas de leccionação (Português, Matemática e Língua estrangeira, o Inglês), de dois ciclos de ensino (3º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Secundário), em diferentes fases de carreira, da Região Centro, cujo objectivo principal era a análise das suas epistemologias em torno de toda a actividade docente: das concepções à percepção dos resultados da sua acção.

Iremos, neste contexto, dar conta, apenas, dos dados reveladores das (in)congruências, ao nível das suas orientações epistemológicas, entre a concepção do processo ensino-aprendizagem e a percepção dos resultados da sua própria acção.

Palavras-chave: orientações metodológicas, epistemologias, processo ensino-aprendizagem, concepções, percepção dos resultados.


Abstract

This article presents the (in)congruencies in teaching-learning process, or the relation between the epistemological orientation of conception and the epistemological orientation of teacher’s perceptions, from Portuguese teachers of mathematics, language and english, i.e., comparative data.

Key words: methodological orientations, epistemologies, teaching-learning process, conceptions, perceptions of results actions.

 

«Está bem documentada a necessidade de investigar as ligações entre as intenções ou modos de pensar dos professores e os seus comportamentos mais directamente observáveis. Analisar, apenas, um aspecto, conduz à definição de modelos incompletos, não preditivos, incapazes de proporcionar bases para inovações.» (Shavelson & Stern, 1981, p. 456).

«Por forma a compreender, predizer e influenciar o que os professores fazem, cabe aos investigadores analisar os processos orientadores e de realização dos docentes.» (Clark & Peterson, 1986, p. 256).


Considera-se que os professores estruturam a sua actividade, agem, muito, ou fundamentalmente, em função das teorias pessoais (concepções /significações/ representações) que possuem (cf. Shavelson & Stern, 1981). Isto é, as decisões, os comportamentos relatados pelos professores, reflectem, ou podem reflectir, em grande medida, as suas crenças em torno do processo em causa (cf., Clark & Peterson, 1986; García, 1988, p. 107).

Igualmente,

É generalizada a opinião de que o comportamento humano não pode ser globalmente entendido apenas baseado em factos exteriores e observáveis. Para ser cabalmente entendido há que ter em conta os pensamentos, as cognições, as crenças do sujeito, pois são estas que determinam e dão significado ao comportamento e que estruturam e organizam o mundo (Clark & Peterson, 1986, 1990).


Embora não seja consensual a relação unívoca representação-acção, por constrangimentos vários, desde a acção estratégica, a acção dependente do contexto situacional, etc., a verdade é que existe, tendencialmente, grande probabilidade das acções serem, muito ou basicamente, orientadas pelos referenciais teóricos assumidos, isto é, pelas significações que temos, pelas nossas concepções. Neste sentido, no contexto específico dos educadores, as suas decisões, as suas acções, por princípio, ancoram-se nas orientações epistemológicas aprendidas, apreendidas, construídas e reconstruídas. Estes quadros conceptuais ou esquemas funcionam como orientadores, que podem, ou justificam mesmo, as suas opções, sendo, grosso modo, e no limite, o dado mais relevante, pese embora as virtuais mediações de outros dados contextuais. Variáveis que podem facilitar ou inibir os pensamentos e as acções dos professores.

Senão, vejamos


«De forma controlada ou automática, e consciente ou não consciente, um grande número dos nossos comportamentos corresponde às nossas representações, (…) aspecto que remete para a problemática da funcionalidade das representações enquanto orientadoras dos comportamentos.» (Vala, 1993, p. 366).


Sabe-se que as representações que os professores têm sobre o que é ciência, sobre o que é fazer ciência, sobre o que é “o” método científico, têm influência não só no que ensinam, mas também no como ensinam as disciplinas científicas curriculares e mesmo qual o significado que parecem atribuir a esse seu ensinar (Praia & Cachapuz, 1998, p. 73).

De facto, a partir destes registos, damos conta da existência de alguma unanimidade na ideia de causalidade recíproca entre representação e comportamento, ou seja, da perspectivação da(s) representação(ões) e do(s)comportamento(s) enquanto variáveis solidárias.

Admitimos, então, que as concepções influenciam todas as acções, sendo influenciadas, igualmente e necessariamente, por toda a experiência de vida, sabendo, todavia, que as nossas interpretações são muito resistentes à mudança (cf. Leyens, 1985).

Neste sentido, inferimos que, no caso dos docentes, as concepções manterão relações estreitas com as preparações das suas acções, com a forma como interagem com os alunos, bem como, com a forma e conteúdo das suas reflexões na e pós-acção (cf. Figueira, 2001). Entre os domínios do pensamento e da actividade do docente existe uma relação recíproca. As acções desenvolvidas pelo professor têm a sua origem, maioritariamente, nos seus processos de pensamento, os quais, por sua vez, são afectados pelas suas acções (Clark & Peterson, 1990, p. 451).

No mesmo sentido, o processo de atribuição de causalidade dos resultados obtidos, dos produtos das acções, isto é, o construto concebido enquanto percepção dos resultados do processo ensino-aprendizagem, é regido pelos mesmos pressupostos, sendo, igualmente e provavelmente, orientado por quadros pré-concebidos, não se negligenciando, contudo, os dados de contexto e dados ocasionais.

Daqui decorre a necessidade, para a compreensão da realidade ou situação educativa, tarefa complexa e multidimensional, de resto, e no que concerne, estritamente, ao vector educador, observar, não apenas o que é directamente visível, as suas acções, mas, igualmente, os seus pensamentos, as suas concepções, significações e atribuições, bem como as suas tentativas de clarificação e justificação.


Foi, pois, sob este signo enquadratório que encetámos a investigação, intitulada Das epistemologias pessoais à epistemologia das práticas educativas, de onde derivam os dados que agora divulgamos, realizada com professores de três áreas de leccionação (Português, Matemática e Língua estrangeira, o Inglês), de dois ciclos de ensino (3º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Secundário), em diferentes fases de carreira, da Região Centro, cujo objectivo principal era a análise das suas orientações metodológicas em torno de toda a actividade docente: das concepções sobre todo o processo ensino-aprendizagem à percepção dos resultados da sua acção (cf. Figueira, 2001). Actividade docente que aglutina, assim, quer as concepções sobre todo o processo ensino-aprendizagem, quer a(s) percepção(ões) dos resultados da sua acção, quer, igualmente, os procedimentos de planificação, instrução propriamente dita, avaliação e remediação dos alunos e auto-avaliação. Ou seja, a conceptualização do processo ensino-aprendizagem apresentada ou assente numa concepção de ensino como processo de resolução de problemas, processo trifásico de planificação (pré-acção), interacção (acção) e reflexão (pós-acção).

Ainda, e desta feita, podemos assumir que a investigação de onde deriva o presente artigo se enquadra sob o Paradigma dos processos mediadores, centrado nos processos cognitivos dos professoresparadigma do pensamento do professor (cf. Figueira, 2001, p. 30 e segs.).

Sumariamente, referimos que este tipo de investigações centra-se, fundamentalmente, no estudo dos pensamentos, crenças, concepções, ou seja, no universo interno dos professores (cf. Zabalza, 1994, p. 35). Assim, o objectivo primordial é conhecer, descrever e interpretar os pensamentos, juízos, decisões e sentimentos dos professores, apreendendo as relações possíveis entre as cognições que ocorrem na mente do professor e as tomadas de decisão no decurso na sua actividade profissional (cf. Shulman, 1989, p. 58).

Segundo este paradigma (cf. Villar Angulo, 1988, 1988a), o professor é, agora, pensado não, apenas, como um técnico que deve dominar um repertório mais ou menos vasto de competências. O estudo dos processos de ensino focaliza-se, orientando-se, para a descrição da actividade cognitiva dos professores. Esta linha de investigação apoia-se no postulado: os comportamentos dos professores são largamente influenciados pelos seus pensamentos ou cognições (cf. Shavelson & Stern, 1981).

A investigação em torno dos processos de pensamento do professor assenta em duas assunções fundamentais, isto é, os seus principais pressupostos, ou premissas, apontam para:

* os professores são profissionais racionais, ou seja, os professores constróem a sua acção de forma reflexiva, agindo em função dos seus pensamentos, juízos e decisões (Zabalza, 1994, p. 30; cf., igualmente, Shavelson & Stern, 1981). Isto é, o professor é um sujeito reflexivo, racional, que toma decisões, emite juízos, possui crenças e cria rotinas próprias no decurso do seu desenvolvimento profissional (cf. Villar Angulo, 1988, 1988a). Os professores são, basicamente, reflexivos, não reactivos (Zabalza, 1994);

* é assumido que os pensamentos do professor guiam e orientam o(s) seu(s) comportamento(s) (cf. Clark & Yinger, 1979; Shavelson & Stern, 1981; Villar Angulo, 1988, 1988a; Zabalza, 1994). Os seus pensamentos (concepções, juízos, crenças, teorias, etc.) guiam a sua acção, e esta, por sua vez, influencia os pensamentos, pressupondo, por isso, um processo dialéctico e construtivista, e não relações causais estritas (Zabalza, 1994; cf., igualmente, Clark & Peterson, 1986, 1990). Pensamento e acção constituem estruturas independentes, mas interligadas, que se vão modificando mutuamente. Neste sentido, embora toda a conduta expressa ou observável esteja organizada ou seja dirigida pelas operações cognitivas dos professores, conhecer o pensamento do professor poderá permitir prever, não predizer, a sua conduta (Lowyck, 1986, 1988, 1990). Através da conduta dos professores, poderemos inferir parcialmente o seu pensamento, mas não explicá-lo e possivelmente nem sequer compreendê-lo (Zabalza, 1994, p. 33).


Grosso modo, e sintetizando, diríamos que as investigações em torno das teorias dos professores podem ser aglutinadas numa grande dimensão: concepções acerca do processo ensino-aprendizagem, com todos os “tentáculos” que este processo envolve: representação do aluno, do papel do professor, a concepção de curriculum, a escolha de metodologias de ensino, de avaliação, etc.

E não será de todo abusivo da nossa parte afirmarmos que os estudos efectuados apontam, regra geral, num mesmo sentido: a adopção, preferencial e global, de concepções mais do tipo tradicional1, academicista, transmissivista, empirista, positivista (para maiores esclarecimentos sobre este tipo de orientação, cf. Figueira, 2001, Capítulo 32), os professores adoptam, preferencialmente, concepções tradicionalistas de ensino, aprendizagem, ciência (Abreu, 1996), muito embora, alguns realçam, já, uma tendência para a mudança, revelando opções eclécticas (cf. trabalhos de Abreu, 1996; Canavarro, 1997; Praia & Cachapuz, 1994, 1998; Teixeira, 2001, por exemplo).


Mas, ainda, antes de dar cumprimento aos objectivos específicos do presente artigo, gostaríamos de tecer algumas notas prévias.

Assim, ao levarmos a cabo a tarefa de caracterização e análise das orientações metodológicas dos docentes (epistemologias) (cf. Figueira, 2001), não foi nosso propósito fazer a apologética de qualquer assunção ideológica em termos metodológicos, nem retirar ilações sobre a eficácia das possíveis posturas dos docentes. Não se pretendeu defender ou fazer a apologia de um determinado tipo de concepção e prática, quer seja pela categorização “práticas tradicionais/práticas activas”, “práticas reprodutoras/práticas construtivas ou criativas”. Tão só, analisá-las (através dos relatos dos seus actores), à luz das representações prévias que lhes subjazem e das concomitantes percepções delas resultantes. Até porque, «No limite, os critérios de eficácia são relativos aos próprios objectivos e significações epistemológicas das orientações metodológicas. (…) cada modelo define os seus próprios critérios de eficácia. E, como não existe acordo ou coordenação entre essas significações, o que é importante para uns, é inexistente ou secundário para outros e vice-versa. (…) É fundamental, pois, ter-se consciência de que cada orientação estima-se geralmente eficaz, produtiva, consequente, etc., em relação aos critérios que se fixaram antecipadamente.» (Joyce-Moniz, 1989, p. 7). Será, pois, a filosofia pessoal (re)construída que proporciona o cenário para a interpretação e acção do processo ensino-aprendizagem. E, embora, por vezes, discrepante, até mesmo, paradoxal, facto é que, por princípio, as ideologias orientam o pensamento e, consequentemente, a acção.

Até porque


“Qualquer juízo sobre a qualidade pedagógica assenta inevitavelmente em pressupostos filosóficos educacionais. Só à luz de uma filosofia da educação, explícita e assumida, é possível equacionar o problema da qualidade da prática pedagógica. (…) A qualidade é a realização dessa ideia.” (Patrício, 1997, pp. 555-556).

e

«Não existem filosofias da educação “certas” ou “erradas”. (…) o importante é reflectir sobre as nossas próprias crenças e não fazer julgamentos sobre elas.» (Zinn, 1998, p. 72).



Ou seja, o que se pretendeu, com este estudo, foi a análise das vivências metodológicas dos professores, a partir das suas próprias narrativas. Isto é, o conhecimento das posições epistemológicas/metodológicas dos educadores, perfis de (dis)continuidade (cf. Figueira, 2001).

De facto, clarificar as filosofias pessoais afigura-se-nos uma tarefa útil, para podermos especular e reflectir sobre os modos de pensar e de agir dos professores, inferindo, apontando vias de formação (cf. Figueira, 2001).

Julgamos que a clarificação das ideologias, pela reflexão sobre as próprias orientações metodológicas, podem auxiliar a reduzir a confusão, aumentar a clareza e direcção, conduzindo a comportamentos e tomadas de decisão mais consistentes (cf. Zinn, 1998, p. 49).


“Filosofar em torno da educação, provavelmente, não faz de nós um filósofo, mas pode ajudar a melhor compreender o educador.” (Zinn, 1998, p. 54).


Podemos melhorar, devemos optimizar. Porém, não há que desvirtuar as funções da Escola e dos professores. A escola e os professores existem para ensinar e educar. E ensinar e educar implica preparação, actuação e reflexão das acções. É por serem actividades de sempre, existindo e coexistindo em qualquer acto ou perspectivas de ensino, que sobre elas nos debruçámos.

O que se pretendeu foi, tão só, saber como os professores encaram e procedem (agem) o processo ensino-aprendizagem, perceber o que dizem pensar, o que dizem fazer e o que dizem sentir, em torno do processo ensino-aprendizagem, verificando, igualmente, o grau de consistência em todos os elementos do processo e a (in)existência de diferenças nas tendências ideológicas, tendo em conta a área e o ciclo de leccionação, em função dos anos de serviço na profissão (cf. Figueira, 2001). Importava perceber se os docentes se situam mais numa lógica educacional centrada neles próprios, ou centrada nos alunos. Ou seja, se são mais do tipo racionalista ou comportamentalista, ou, ao invés, mais do tipo cognitivista ou construtivista, ou se, por outro lado, assumem posições eclécticas, ou mesmo, neutras (cf. Figueira, 2001, fundamentalmente, Capítulo 3), o que remete para o seu estilo pessoal de ensino (cf. Conti, 1998). São estes pressupostos que orientarão o docente na escolha dos métodos de ensino, avaliação, formas de planificar, etc. (cf., igualmente, Figueira, 2001, Capítulo 3).

Em síntese, pretendeu-se analisar as relações entre:


práticas docentes à luz das concepções que lhes “subjazem” e das “concomitantes” percepções delas resultantes, por via de relatos dos professores/actores,

em que,

As Concepções do processo ensino-aprendizagem remetem para os significados pessoais e gerais em torno do processo ensino-aprendizagem, ou seja, interpretações do ensino e do ensinar, da competência e desempenho dos professores, da sua eficácia, da satisfação nas actividades docentes, do melhor método, da aprendizagem, das funções do professor e do aluno e das dificuldades percepcionadas nas actividades docentes. Grosso modo, remete para o que se diz que se pensa. Ou seja, sobre este título pretende analisar-se as significações pessoais em torno do processo ensino-aprendizagem, a partir de dez operacionalizações: que leitura se tem do ensino e do ensinar, da competência e desempenho dos professores, sua eficácia, satisfação nas actividades docentes, do melhor método, da aprendizagem, das funções do professor e do aluno, e das dificuldades nas actividades docentes.

Quanto aos Comportamentos/acções, ou dimensões da prática, dizem respeito às verbalizações (relatos, narrativas) relativas às práticas de planificação, às metodologias de interacção, à avaliação dos alunos e à remediação das suas dificuldades e à auto-avaliação das actividades de ensino. Grosso modo, remete para o que se diz que se faz, como e porque se faz, para as actividades pré-activas ou preparativas, actividades interactivas e actividades avaliativas e de remediação.

Assim, nas dimensões da prática, analisam-se vários aspectos da planificação [pré-acção], como, por exemplo, as suas tipologias, as formas, os conteúdos, os factores determinantes e os critérios de selecção dos métodos e actividades (cf. Figueira, 2001). Sucintamente, ao nível da Interacção, tenta analisar-se a estrutura de uma aula-tipo, os métodos utilizados e os critérios. Ao nível da Avaliação dos Alunos, analisa-se as modalidades, os parâmetros e os momentos da avaliação. Por fim, quanto à Remediação das Dificuldades dos Alunos, analisa-se as estratégias utilizadas e os seus critérios de escolha (cf. Figueira, 2001). No que concerne à dimensão Auto-Avaliação dos professores [pós-acção], tenta analisar-se a sua (in)realização e seus figurinos possíveis (cf. Figueira, 2001).

Relativamente às Percepções dos resultados, estas prendem-se com os pensamentos relativos aos resultados das acções, em termos de autocompetência, autodesempenho, auto-satisfação nas actividades de ensino e percepção de participação e de desempenho dos alunos. Grosso modo, remete para o que se diz que se sente. Esta rubrica analisa-se a partir das percepções de autocompetência, autodesempenho, auto-satisfação nas actividades de ensino (Percepções de si) e percepção de participação e de desempenho dos alunos (Percepção sobre os alunos), sendo, pois, estas dimensões apontadas as operacionalizações da percepção dos resultados do processo ensino-aprendizagem (cf. Figueira, 2001).

A percepção de autocompetência apela para o autojulgamento dos professores relativamente ao preenchimento (ou não) dos requisitos e elementos necessários às tarefas de ensinar. Ou seja, a auto-análise dos conhecimentos, capacidades (aptidões) e crenças que o professor possui e pode actualizar nas situações de ensino, «"Teacher competence" refers to the sets of knowledges, abilities (skills), and beliefs a teacher possesses and brings to the teaching situation.» (Medley, 1982, p. 1894). Incluem-se, pois, nesta categoria, os comportamentos, ou actividades, pré-activos do professor, fora da sala de aula, ou seja, com os alunos ausentes, como a planificação, a avaliação e outras actividades de preparação do ensino, bem como os conhecimentos, os skills e os valores que possui (cf. Medley, 1987, p. 105).

A percepção de autodesempenho pretende analisar o seu grau de julgamento, de auto-avaliação, relativamente ao(s) seu(s) próprio(s) desempenho(s) no ensino. Interpretar a valoração da capacidade de actualização das competências necessárias para ensinar. Ou seja, perceber o valor atribuído pelos professores às suas próprias realizações, às performances, aos comportamentos, em contexto de sala de aula. O desempenho considerado, assim, como os comportamentos do professor enquanto ensina, como a implementação ou a actualização das competências, o produto da interacção entre as características do professor (suas competências) e as características do contexto (aluno/escola) (Medley, 1982, p. 1894).

A percepção de satisfação nas actividades de ensino apela para o autojulgamento relativamente ao nível de satisfação obtido, pelos professores, nas actividades de ensino, ou seja, nas actividades ou tarefas que envolvem um contacto directo com os alunos. A satisfação nas actividades de ensino entendida como o sentimento, ou conjunto de sentimentos, a valoração atribuída ao resultado do comportamento, circunscrito às tarefas de ensino, ao acto de ensinar, relacionado com o conteúdo das tarefas em si, e/ou tarefas que envolvem o contacto directo com os alunos. Actividades ou tarefas que são independentes do contexto, ou condições, externo (ex.: equipamento, apoios, salário, relação com os colegas, outros). Fazendo parte da satisfação profissional, a satisfação nas actividades de ensino circunscreve-se ao ensino em si mesmo, Work itself, na conceptualização de Lester (1987). Nas suas palavras, corresponde «(...) is the job of teaching or the tasks related to the job.» (Lester, 1987, p. 230).

Quanto às Percepções sobre os alunos, de participação, remete para a percepção que os professores têm relativamente ao grau de participação dos seus alunos nas actividades de ensino. A percepção de desempenho/resultados diz respeito à percepção que os professores têm dos desempenhos/resultados dos seus alunos (cf. Figueira, 2001).


Neste sentido, o objectivo foi analisar esta relação, tendo em conta as hipotéticas variabilidades em função do nível, ciclo, área de leccionação e tempo de serviço na profissão. E, igualmente, foi nosso intento, ver se existe um padrão (estrutura) ou padrões únicos de pensamento/acção, ou se esta tríade varia (e o que varia) e em função de quê, analisando as virtuais (in)coerências no processo.

Pretende-se, assim, a análise do grau de homogeneidade vs. variabilidade (continuidade vs. descontinuidade) intra e intergrupal nas fases do processo, em função da área e ciclo de leccionação (Matemática, Português e Inglês dos 3º Ciclo do Ensino Básico e do Ensino Secundário), tendo em conta o tempo de serviço na profissão (professores Estagiários, em Início, Meio e em Final de Carreira).



Método

Os resultados que apresentamos, neste artigo, relativos à análise das relações entre a concepção do processo ensino-aprendizagem e a percepção dos resultados da acção dos educadores, ao nível das suas orientações epistemológicas, ou seja, análise comparativa das (in)congruências das orientações metodológicas ao nível das dimensões concepções e percepções dos resultados do processo ensino-aprendizagem, numa amostra de professores de Português, Matemática e Inglês, dos 3º Ciclo e do Ensino Secundário, em diferentes fases de carreira, da Região Centro, derivam de um estudo mais vasto (cf. Figueira, 2001) de descrição dos pensamentos ou cognições dos professores em torno do processo ensino-aprendizagem, quer em termos das suas concepções, quer em termos da expressão da sua acção docente, antes, durante e após a interacção com os alunos, quer, ainda, em termos das percepções dos resultados dessas mesmas acções – conhecimento das posições epistemológicas/vivências metodológicas dos professores, face ao processo ensino-aprendizagem, quer em termos de concepção quer nas significações das acções. Isto é, a investigação pressuponha a análise das epistemologias das práticas educativas de professores de diferentes áreas de leccionação, com vista à elaboração de perfis de pensamento e acção docentes, realizado a partir de entrevistas semiestruturadas, tendo em conta o tipo de Concepção do processo Ensino-Aprendizagem (Concepções), tipo de processo Preparação, tipo de Interacção, tipo de Avaliação dos alunos, tipo de Remediação dos alunos, tipo de Auto-Avaliação (Acções) e tipo de Percepção dos Resultados do processo Ensino-Aprendizagem (Percepções) [sete (7) variáveis)] (cf. Figueira, 2001).

O conteúdo obtido, para cada uma das dimensões, foi, posteriormente, categorizado, tendo sido encontradas cinco (5) categorias designadas por Racionalista, Positivista, Construtivista, Ecléctica3 e Neutra4 (5 níveis para cada variável) (cf. Figueira, 2001), ou seja as (meta)metodologias de ensino, ou orientações epistemológicas ou metodológicas de ensino, propostas por Joyce-Moniz (1989, in Figueira, 2001, pp. 233-238), numa taxonomia bastante holística.

A orientação final para cada uma das dimensões da prática educativa, tal como para a percepção dos resultados, teve como critério a moda, ou seja, a epistemologia mais frequente.


De uma forma sucinta, diríamos que a orientação Racionalista ou Tradicional concebe o processo ensino-aprendizagem como muito centrado no professor, baseado numa pedagogia de conteúdos, na transmissão de conhecimentos, no enciclopedismo e academicismo, no inatismo e maturacionismo… (cf. Figueira, 2001, p. 233 e pp. 239-256). A orientação Positivista, Comportamental, ou de racionalidade técnica, baseia-se numa pedagogia por objectivos, na operacionalidade, no empirismo, concebendo o processo ensino-aprendizagem centrado no indivíduo, na aprendizagem individual, nos produtos finais directamente observáveis … (cf. Figueira, 2001, p. 233 e pp. 257-283). Contrariamente, a ideologia Construtivista, ou Fenomenológica, entende o processo ensino-aprendizagem enquanto pedagogia dos processos, centrada nos interesses e necessidades da turma, enfatizando o aprender a construir, construir para aprender, aprender a aprender (cf. Figueira, 2001, p. 233 e pp. 284-322).


A título exemplificativo, temos algumas respostas dos professores da amostra (Quadro 1):



Quadro 1: Exemplos de respostas dos professores e respectivas categorizações


Racionalista


(Tradicional)

«Transmitir saberes, de forma cativante, motivadora»

«Sabe para si e sabe transmitir aos outros o que sabe. Sabe muito»

«Consegue ensinar sem dificuldades e consegue que os alunos tenham boas notas, especialmente nos exames nacionais»

«Motiva e interessa os alunos. Prepara os alunos para o futuro mundo do trabalho»

«Motivar os alunos de forma que eles gostem de ler e de escrever»

«Expositivo, por parte do professor. Expositivo, lido ou de memória»

«Aplicação, empenho, vontade, interesse, esforço»

«Motivar os alunos e transmitir-lhes o gosto pelo saber. Estar disponível. Gostar do que faz»

«Aprender e respeitar os outros»

«Cumprir os longos programas»

Positivista


(Comportamental)

«Transmitir conteúdos, tendo em conta as características particulares de cada aluno»

«Planifica coerentemente as aulas, adaptando estratégias e materiais, de acordo com as suas turmas, de modo a que os alunos atinjam os objectivos pretendidos»

«Sente-se gratificado com as suas tarefas. Gosta de ensinar e vê resultados positivos nos alunos»

«Conduz a uma boa aprendizagem»

«Se preocupa com a aprendizagem dos alunos»

«Consegue conciliar conteúdos/turma»

«Desenvolvimento de aptidões»

«Ensinar e respeitar os alunos»

«Aprender. Esforçar-se, estar com atenção, concentrado e estudo individual»

Aproximar o ensino a cada aluno»

Construtivista


(Criativa; Fenomenológica; Humanista)

«Conduzir ao gosto pela aprendizagem, pelo saber»

«Ensina a aprender e aprende a ensinar»

«Sentir que os alunos aproveitam das actividades. Sente que contribui para desenvolver a responsabilidade e a cidadania»

«Consegue conciliar desenvolvimento científico e pessoal»

«Implementa boa dinâmica, promove actividades educativas divertidas e interessantes»

«Coloca o aluno no centro do processo ensino-aprendizagem»

«Aquisição de saber. Partilha de saberes»

«Criar condições para que o ensino-aprendizagem se realize. (...) Ouvir e ser ouvido»

«Aprender a estudar»

«Pouco tempo para preparar as aulas e os materiais»

Ecléctica


«Enriquecer os alunos em termos cognitivos e pessoais»

«Se empenha nas tarefas»

«Consegue motivar os alunos, de modo que aprendam e tenham resultados positivos»

«Conhecimento»

«Orientar, explicar, ensinar»

«Estudar, estar com atenção. Cumprir as propostas de remediação. Sacrifício e grande vontade de aprender»

«Horários incompatíveis com o dia-a-dia. Programas extensos. Turmas grandes»

Neutra


«Ensina»

«Consegue ensinar»

«Passou de uma geração a outra»

«Vê o seu trabalho reconhecido»

«Alia a intuição ao conhecimento dos alunos»

«Caminho aberto»

«Tantas mudanças e tantas exigências burocráticas»

Tal como havíamos, já, referido, os dados foram obtidos a partir de questões abertas - tipo associação livre - breves narrativas escritas, com posterior categorização, via análise de conteúdo (cf. Anexo A, Figueira, 2001).


A amostra, do presente estudo, é constituída por 89 professores, de três áreas disciplinares: Língua Portuguesa e Português (N=30), Língua Estrangeira (Inglês) (N=30) e Matemática (N=29), de dois ciclos de ensino: 3º Ciclo do Ensino Básico (N=46), e Ensino Secundário (N=43), sendo 63 do género feminino e 26 do género masculino, subdivididos em quatro níveis, consoante os anos de serviço na profissão (cf. Quadro 2).

A sua grande maioria é docente em instituições da cidade de Coimbra (escolas básicas e secundárias, bem como colégios), embora existam alguns elementos a leccionar, quer noutras localidades do distrito de Coimbra, quer em alguns outros distritos e cidades do país.

E, embora tenhamos analisado exaustivamente os dados obtidos na nossa investigação (cf. Figueira, 2001), iremos, neste artigo, dar conta, apenas, da relação, ao nível das orientações epistemológicas, entre a concepção do processo ensino-aprendizagem e a percepção dos resultados da própria acção dos professores. Relação, em termos das suas (in)congruências ou (ir)regularidades.


Resultados

Constatámos que, genericamente e globalmente, as relações de coerência entre a concepção e a percepção dos resultados do processo ensino-aprendizagem são frágeis ou inexistentes, registando-se grande desfasamento entre o que dizem que pensam em torno do processo ensino-aprendizagem (Concepção) e os pensamentos relativos aos resultados das acções, em termos de autocompetência, autodesempenho, auto-satisfação nas actividades de ensino e percepção de participação e de desempenho dos alunos (Percepção dos Resultados) (o que dizem que sentem) (cf. Quadro 3).




Quadro 3: Opção ideológica tendencial, endogrupo, tendo em conta a totalidade da amostra


Processo

Tipo de Orientação



Totalidade dos sujeitos

* Concepção

*Percepção dos resultados




Racionalista

Neutra




De facto, aquando da nossa análise interdimensões, e sua evolução ao longo da carreira, especificamente, aquando da análise da relação entre a orientação da concepção do processo ensino-aprendizagem e a percepção dos resultados desse mesmo processo, verificamos, para todos os sujeitos (amostra na totalidade) (cf. Quadro 4) que não existe congruência entre a opção ideológica da concepção do processo ensino-aprendizagem e a opção da percepção dos resultados desse mesmo processo. Ou seja, genericamente, regista-se um grande desfasamento entre a concepção que os professores têm do processo educativo (o que dizem que pensam) e os pensamentos relativos aos resultados das acções, em termos de autocompetência, autodesempenho, auto-satisfação nas actividades de ensino e percepção de participação e de desempenho dos alunos (o que dizem que sentem).

De assinalar, ainda, que este padrão é comum em todos os subgrupos, em função do tempo de serviço na profissão (cf. Quadro 4).

Quadro 4: Orientação da Concepção do processo E-A. e da Percepção dos Resultados do processo E-A., para a totalidade da amostra, tendo em conta o ciclo de leccionação e os anos de serviço na profissão



3º Ciclo (N=46)

Secundário (N=43)

Processo

Idade Prof.

Estagiár.

Início C.

Meio C.

Final C.

Total

Estagiár.

Início C.

Meio C.

Final C.

Total


Concepção

Totalidade

Racion.

Racion.

Const.

Racion.

Rac.

Racion./
Const./

Ecléct.

Positiv./

Const.

Positiv.

Racional.

Rac.

Percepção

Resultados

Totalidade

Ecléctica/

Neutra

Neutra

Neutra

Ecléct.

Neutra

Ecléctica

Construt.

Neutra

Neutra

Neutra




De facto, por um lado, quando analisamos a dimensão Concepção do processo ensino-aprendizagem, tendo em conta a sua evolução ao longo da carreira, para todos os sujeitos, ou a amostra na sua totalidade, registamos que a orientação metodológica preferencial é a do tipo Racionalista, e isto independentemente do ciclo de leccionação. Registam-se, apenas, diferenças ideológicas nos subgrupos dos professores em Meio de Carreira a leccionar no 3º Ciclo (tipo Construtivista), e nos em Início e Meio de Carreira a leccionar no Ensino Secundário (tipo Positivista/Construtivista e tipo Positivista, respectivamente) (cf. Quadros 4 e 5).

Quando temos em conta os sujeitos das diferentes áreas de leccionação

Genericamente (cf. Quadros 5):


Quadro 5: Orientação da Concepção do processo E-A. e da Percepção dos Resultados do processo E-A., tendo em conta a área de leccionação, o ciclo de leccionação e os anos de serviço na profissão



3º Ciclo (N=46)

Secundário (N=43)

Processo

Idade Prof.

Estagiár.

Início C.

Meio C.

Final C.

Total

Estagiár.

Início C.

Meio C.

Final C.

Total

Área Lecc.














Matemática

Racion.

Racion.

Positiv.

Racion.

Rac.

Racion.

Racion./

Positiv

Positiv./

Const.

Racional.

Rac.

Concepção

Português

Ecléctica

Positiv.

Construt.

Racion.

Const.

Positiv./

Const./

Ecléctica

Positiv.

Positiv./

Racion.

Racional.

Rac.


Inglês

Construt.

Racion.

Construt.

Ecléct.

Const.

Construt.

Construt.

Racion./

Positiv./

Constr./

Ecléc.

Racional.

Const.

Total tipo Racionalista


Matemática

Neutra

Neutra

Neutra

Ecléct.

Ecléc./

Neutra

Ecléctica

Constr./

Ecléctica

Positiv./

Neutra

Ecléctica

Ecléct.

Percepção

Resultados

Português

Racion./

Positiv./

Neutra

Neutra

Neutra

Positiv.

Neutra

Ecléctica

Neutra

Positiv./

Neutra

Positiv./

Neutra

Neutra


Inglês

Constr./

Ecléctica/

Neutra

Neutra

Ecléctica

Construt.

Const./

Ecléc./

Neutra

Construt.

Construt.

Neutra

Neutra

Neutra

Total tipo Neutra


Por seu turno, quando se analisa a dimensão percepção dos resultados do processo ensino-aprendizagem, tendo em conta a sua evolução ao longo da carreira, a orientação metodológica preferencial manifesta pelos professores é do tipo neutro, sem grande, ou com total ausência, de especificidade (cf. Quadro 5).

De salientar que, independentemente do ciclo de leccionação, a tendência orientadora geral é a Neutralidade, ou seja, respostas que apontam para factores de ordem geral que justificam a percepção que os docentes têm dos resultados do processo ensino-aprendizagem. A análise ao longo da carreira ressalva as excepções dos professores em Final de Carreira, a leccionar no 3º Ciclo, com uma orientação Ecléctica, e os professores em Estágio e em Início de Carreira, a leccionar no Ensino Secundário, com orientações manifestas dos tipos Ecléctica e Construtivista, respectivamente.

Quando temos em conta os sujeitos das diferentes áreas de leccionação (cf. Quadro 5):




Mesmo analisando as respostas dos sujeitos, tendo em consideração a sua área de leccionação, vemos que não existe congruência entre a opção ideológica da Concepção do processo ensino-aprendizagem e a Percepção dos resultados desse mesmo processo (cf. Quadro 5).

Tal como se registava com a amostra na sua totalidade, também, agora, se verifica um grande desfasamento entre a Concepção que os professores têm do processo educativo (o que dizem que pensam) e os pensamentos relativos aos resultados das acções, em termos de autocompetência, autodesempenho, auto-satisfação nas actividades de ensino e percepção de participação e de desempenho dos alunos (o que dizem que sentem) (cf. Quadro 5).

É de referir, ainda, que este padrão é comum em todos os grupos de leccionação e subgrupos, em função do tempo de serviço na profissão, com uma excepção ligeira ao nível dos professores de Inglês do 3º Ciclo: Concepção do processo ensino-aprendizagem (tipo Construtivista) e Percepção dos resultados deste processo (tipo Construtivista/Ecléctica/Neutra) (cf. Quadro 5).


Ou seja, grosso modo e em termos gerais, regista-se um total desfasamento entre a orientação da concepção do processo ensino-aprendizagem e a orientação da percepção dos resultados. Situação verificada entre outras5 dimensões do processo ensino-aprendizagem (cf. Figueira, 2001).

Discussão

Abstraindo-nos, agora, um pouco das variabilidades grupais, em função da área, ciclo e percurso profissional, e em rigor, os resultados realçam Concepções, tendencialmente, Tradicionalistas. De facto, este cenário Tradicionalista é muito característico nos professores de Matemática, pois os restantes professores, em especial os de Inglês, já manifestam outro tipo de Concepção.

Todavia, em termos globais, podemos afirmar que a orientação tendencial da Concepção do processo ensino-aprendizagem, por nós encontrada, não parece afastar-se dos resultados obtidos por outras investigações (cf. Teixeira, 2001), muito embora Brooks e Brooks (1993) refiram que muitos professores assumem e aceitam, teoricamente, os princípios construtivistas. Para estes autores, «Os professores querem que os alunos assumam responsabilidade pela sua aprendizagem, sejam pensadores autónomos, que desenvolvam compreensões integradas dos conceitos e que saibam questionar, reflectir, etc…, contudo, poucos são os que, na prática, conseguem actualizar estes tópicos e metodologias.» (Brooks & Brooks, 1993, p. 13). É que «A mudança de paradigma está muito dependente das memórias dos professores, quer enquanto estudantes, quer enquanto aprendizes de professor, quer enquanto mesmo professor, das suas crenças, valores, versões privadas de verdade, de presente e de futuro (…).» (Brooks & Brooks, 1993, p. 13).

De facto, verifica-se, em termos de Práticas, resistências dos professores à mudança de paradigma (cf. Brooks & Brooks, 1993). Isto porque consideram, genericamente, que a forma como orientam as suas acções conduz a bons resultados, ou a resultados consonantes com os seus objectivos, isto é, têm percepções positivas das suas opções (Brooks & Brooks, 1993, pp. 101-102). Parece que «(...) os professores tendem a ensinar mais como foram ensinados do que como foram ensinados a ensinar.» (Jones, 1975, in Fosnot, 1996, p. 294).

De referir, também, relativamente à percepção dos resultados, que esta, quando pensada e respondida, o é de maneira muito vaga e geral (tipo Neutra), denotando-se dificuldades na assunção de uma ideologia orientadora neste processo. Subentende-se que os seus conteúdos são marginais ao processo ensino-aprendizagem. As atribuições dos resultados são vagas e gerais, revelando uma ausência ideológica orientadora. Os seus conteúdos não se focalizam nem nas características pessoais ou conhecimentos científicos do educador (perspectiva Racionalista), nem nos objectivos e resultados (produtos visíveis, quantificáveis e quantificados e imediatos) alcançados pelos alunos, ou nos aspectos técnicos do processo ensino-aprendizagem (como preconiza a perspectiva Positivista), nem, tão pouco, nos múltiplos factores influenciadores deste processo (como prevê a perspectiva Construtivista). Quanto às justificações dos resultados do processo educativo (Percepção dos resultados do processo ensino-aprendizagem), as orientações são, pois, dúbias ou neutras, revelando, os docentes, pouca convicção nas suas assunções.

E, embora não pareça ser o caso dos nossos resultados (cf. Figueira, 2001), «(…) simultaneamente, os professores são um grupo profissional particularmente sensível ao efeito de moda, o que levou certos pedagogos a criarem ortodoxias como defesa contra o abastardamento dos seus métodos ou técnicas. Uma vez na praça pública, as técnicas e os métodos pedagógicos são rapidamente assimilados, perdendo-se, de imediato, o controlo sobre a forma como são utilizados. As modas estão, cada vez mais, presentes no terreno educativo, em grande parte, devido à impressionante circulação de ideias no mundo actual.» (Nóvoa, 1992, p. 17). Todavia, adverte, ainda, o autor que «A adesão pela moda é a pior maneira de enfrentar os debates educativos, porque representa uma “fuga para a frente”, uma opção preguiçosa que nos dispensa de tentar compreender. De todas as formas, não vale a pena grandes hesitações, porque atrás de uma moda outra virá, uma alteração à superfície para que nada mude em profundidade (Perrenoud, 1992).» (Nóvoa, 1992, p. 17).


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* Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. [email protected]

1 Por oposição, ou confronto, com as concepções construtivistas-relacionais (cf. Teixeira, 2001) ou racionalistas-construtivistas ou, mesmo, racionalistas dialécticas (cf. Praia & Cachapuz, 1994, 1998).

2 Todavia, somos de alertar para o facto de nós não utilizarmos as mesmas designações que a maioria dos autores consultados. Para nós, as concepções tradicionais ancoram-se nas ideologias racionalistas e não nas orientações comportamentalistas ou positivistas. Admitimos e aceitamos, porém, que as concepções construtivistas ou criativas podem radicar-se, igualmente, nas perspectivas racionalistas e fenomenológicas (cf. Figueira, 2001, Capítulo 3, ponto 3.9.3. Orientação Construtivista).

3 Enquadram-se nesta categoria as respostas mescladas, compósitas, ou seja, que apontam para mais do que uma orientação ,metodológica.

4 Nesta categoria, inscrevem-se as respostas que não têm enquadramento em qualquer das orientações previstas.

5 De facto, cf. Figueira (2001) e outros artigos, no prelo.