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Formação continuada de professores: direções sugeridas pelas respostas de professores do Ensino Fundamental após o estudo de conceitos e princípios da teoria de desenvolvimento de Henri Wallon.

Edson Sayeg

PUC-SP (Brasil)


Resumo:

O artigo consiste em relato de uma pesquisa exploratória realizada junto a professores (3) do Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries) e coordenador pedagógico do Estado de São Paulo, durante o segundo semestre de 2003, com o objetivo de obter direções para o planejamento em formação continuada.

O pesquisador introduziu aos professores e coordenador pedagógico, nos horários de trabalho pedagógico coletivo (HTPC), conceitos e princípios da teoria de desenvolvimento de Henri Wallon com o propósito de promover um melhor entendimento sobre a falta de interesse dos alunos pelas atividades escolares, problema indicado pelos professores.

Foram estudados dois textos teóricos. O primeiro, elaborado pelo pesquisador, apresentou as idéias mais gerais da teoria. O segundo apresentou as características do estágio da puberdade e da adolescência, período no qual se encontram os alunos dos professores participantes. Ao final de cada encontro (17), os professores responderam por escrito às questões propostas pelo pesquisador, o que foi útil para regular o processo de estudo e registrar as necessidades de aprofundamento ou esclarecimento teórico. Após o estudo dos textos teóricos, professores e coordenador pedagógico foram entrevistados individualmente.

A análise das respostas à luz da teoria walloniana possibilitou sugerir direções para a formação continuada de professores, referentes ao desenvolvimento do aluno em suas dimensões motora, afetiva e cognitiva e suas implicações para o planejamento pedagógico e organização escolar.

Palavras-chave: formação continuada de professores; teoria de desenvolvimento de Henri Wallon.

Abstract:

This study consists of an exploratory research that was carried out with Elementary School teachers (5th to 8th grades), as well as with the school’s pedagogical coordinator. The data was collected at a school in the State of Sao Paulo, during the second semester of 2003. The objective was to obtain guidelines for the planning of learning activities in continuing education.

The researcher presented concepts and principles of the Henri Wallon’s theory of development to the teachers and coordinator, during their collective pedagogical work time, known in that context as HTPC. The purpose was to promote a better understanding about the students’ lack of interest for the school activities, which had been pointed out by the teachers as a current problem.

Two theoretical texts were read. The first, written by the researcher, showed the theory in general aspects. The second one presented the characteristics of the adolescence and teenage stages, in which the referred students are.

At the end of each meeting (17), the teachers answered to some questions asked by the researcher. The result was some written material that was very useful to regulate the study process and register eventual needs for deepening or clarification of the theory. After the study of the texts, the teachers and the coordinator were individually interviewed.

The analyses of the answers, to the light of the Wallonian theory, made it possible to suggest guidelines to the teachers’ continuing education, in relation to the students development in the motor, affective and cognitive dimensions, as well as their implications in the pedagogical planning and school organization.


Introdução

A teoria de desenvolvimento de Henri Wallon apresenta possibilidades relevantes para analisar o comportamento dos alunos, assim como para orientar as ações docentes.

Em linhas gerais, a teoria walloniana sugere a complementaridade entre desenvolvimento e aprendizagem. Essa complementaridade se dá porque o desenvolvimento, para concretizar-se, não pode prescindir da educação. Esta, por sua vez, particularmente quando enfocada sob o ponto de vista escolar, não pode ignorar as condições do desenvolvimento para tornar-se mais efetiva (Wallon, 1975). Assim, aprendizagem é uma necessidade inerente à infância: desde o nascimento, a criança está aberta às influências do meio em que vive.

Se aprendizagem é uma necessidade inerente ao desenvolvimento da criança e do jovem, cabe considerar, por sua vez, que nem sempre o ensino recebido vai ao encontro de suas necessidades, notoriamente as que expressam as exigências de cada período do desenvolvimento (Merani, 1977). Ademais, os alunos são diferentes entre si e exprimem tais diferenças nos gostos e aptidões para atividades com distintas características (Wallon, 1975). À falta de atendimento dessas necessidades e à desconsideração das características individuais, os alunos respondem, por suposto, com a falta de interesse, com o baixo nível de aprendizagem, com o absenteísmo e, nos extremos, com a evasão escolar. Conseqüentemente, é preciso ajustar o ensino aos alunos a fim de satisfazer as suas necessidades de desenvolvimento, sempre levando em conta as diferenças individuais.

Na perspectiva walloniana, o ajuste do ensino aos alunos apresenta, dentre outras demandas, o conhecimento do aluno concreto, isto é, o conhecimento sobre o meio em que vive e sobre o estágio de desenvolvimento no qual se encontra (Wallon, 1975). Trata-se de uma exigência cujo atendimento requer, ao mesmo tempo, conhecimento teórico e habilidade para observar e analisar os elementos provenientes das situações de aprendizagem. Logo, para ajustar o ensino aos alunos os professores não podem prescindir de uma sólida formação teórica e prática, vindo a reiterar a necessária articulação entre os termos nos processos formativos.

A teoria walloniana também propõe atividades grupais, pelo que o grupo propicia em termos de descoberta de si mesmo, desenvolvimento de aptidões e de valores (Wallon, 1975). Neste sentido, espera-se que os professores apresentem, além da habilidade para formar e conduzir grupos, clareza dos valores a serem desenvolvidos. Estes devem ser, segundo Wallon (1975, 1977), os desejáveis para a formação de uma sociedade democrática e mais igualitária. Os fatos políticos, econômicos e sociais devem ser objeto de análise no espaço escolar, de modo a favorecer a integração do desenvolvimento intelectual com o conhecimento da sociedade onde o aluno está inserido. Esta integração requer, por seu turno, uma formação de professores que, além de promover uma efetiva articulação entre teoria e prática, também explicite a dimensão política do papel docente (Geraldi, 2001).

Método

A pesquisa consistiu em estudo exploratório (Selltiz et al., 1975), por meio do qual pretendemos aprofundar o nosso conhecimento sobre as possibilidades de aplicação da teoria walloniana para a formação de professores.

Nesta pesquisa foi definida, a priori, por força de interesse do próprio estudo, a teoria de desenvolvimento de Henri Wallon e os seguintes procedimentos: caracterização da escola e dos professores, levantamento e contextualização de um tema de estudo, leitura de textos teóricos e entrevistas. No decorrer da pesquisa, introduzimos aulas expositivas para atender às demandas surgidas durante o processo.

A introdução da teoria de desenvolvimento de Henri Wallon justifica-se pela sua possibilidade de análise de determinados comportamentos dos alunos, assim como pela possibilidade de orientação à prática pedagógica. Essa teoria também apresenta uma visão multidimensional do desenvolvimento, atribuindo a mesma importância para os domínios motor, afetivo e cognitivo, vindo a fornecer subsídios importantes para o trabalho do professor. Justifica-se, finalmente, porque enfatiza o papel da escola no desenvolvimento do aluno.

Com base no entendimento de que a prática do professor é multifacetada, compreendendo desde o planejamento até as formas de interagir com os alunos ou as atividades na sala de aula, consideramos que, a despeito de outros fatores que influem na efetividade do trabalho escolar, como a determinação do conjunto de professores para promover a aprendizagem a todos os alunos e o engajamento desses profissionais em atividades colaborativas, as análises dos professores a respeito de suas ações e dos problemas que encontram na sala de aula, referenciadas na teoria, já podem ser indícios de um aprimoramento profissional.

Procedimentos

A facilidade de acesso à escola, tanto pela sua localização como pela disponibilidade da direção escolar às propostas de trabalhos acadêmicos, foi o principal critério de escolha.

O primeiro contato do pesquisador com a escola ocorreu na primeira semana de agosto de 2003, quando expôs à vice-diretora a sua proposta de pesquisa e recebeu instruções para dar início aos trabalhos. Basicamente, o pesquisador foi orientado a fazer contato com o coordenador pedagógico a fim de apresentar-lhe a sua proposta e combinar os acertos: dia e horário. Por sugestão do coordenador pedagógico, a pesquisa se daria às quartas-feiras, das 12h às 13h, no período correspondente ao Horário de Trabalho Coletivo Pedagógico (HTPC), visto que neste dia havia presença de um maior número de professores.

Na mesma semana em que houve os acertos com o coordenador pedagógico, já na sessão de HTPC, o pesquisador apresentou novamente a sua proposta de pesquisa ao grupo de professores, inicialmente sete (7), ressaltando que a participação dos docentes era, necessariamente, voluntária. Aos que não desejassem participar da pesquisa, havia a possibilidade de tomar parte do HTPC às sextas-feiras, como era de praxe quando algum professor não podia estar presente no HTPC às quartas-feiras.

Devido às habituais alterações no quadro docente no início de cada ano letivo, foi acordado que o estudo duraria o período correspondente ao semestre corrente. Houve um total de 17 encontros, iniciados em agosto e encerrados em dezembro de 2003.

No início do ano letivo de 2004, o quadro docente mudou significativamente: uma professora que participava assiduamente das reuniões pedagógicas foi transferida para outra escola e os novos professores (4) não demonstraram interesse em dar continuidade à pesquisa.

Cabe esclarecer que o número de professores participantes variava a cada sessão. Dos sete professores participantes, apenas três, mais o coordenador pedagógico, constituíam um núcleo estável. Uma professora precisou afastar-se por motivo de doença. Uma outra passou a freqüentar o HTPC às sextas-feiras porque havia conseguido aulas em uma escola particular nas tardes das quartas-feiras e, logo em seguida, desligou-se da escola. Outras duas iam às sessões de estudo não assiduamente: uma, devido a problemas de saúde na família; a segunda não esclareceu o motivo. Para efeito de pesquisa, foram considerados apenas os três professores cujas faltas não ultrapassaram a duas sessões.

Embora tenha participado dos encontros de estudo, o coordenador pedagógico não realizou os registros escritos e individuais solicitados pelo pesquisador, alegando que, enquanto coordenador, permanecia fora da sala de aula.

Caracterização da Escola

A escola onde se deu a pesquisa pertence à rede pública do Estado de São Paulo. Situada em bairro próximo ao centro da Capital, a referida escola está direcionada para o Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries). Para cada classe, o número de matrículas varia de 40 a 45.

Na última avaliação do Sistema de Avaliação da Rede de Escolas Públicas do Estado de São Paulo (SARESP), em 2003, a média de todas as séries da escola obtida na prova de redação, que valia 10 pontos, foi de 4,25. Na prova com questões, de um total de 30 (trinta), a média de acertos foi de 14,77. Essas médias são indicativas de que o desempenho dos alunos está abaixo das notas médias de cada prova, evidenciando pouca aprendizagem, o que está em desacordo com o Projeto Político Pedagógico da escola: “Construir o conhecimento junto com o aluno”.

A escola conta com um Plano de Gestão Escolar – 2003 a 2006 –, em que constam as diretrizes da escola e uma caracterização de sua clientela. Essa caracterização apresenta os seguintes dados: nacionalidade dos pais e das mães dos alunos, ocupação dos pais e das mães dos alunos; renda familiar; moradia; posse de bens, como automóveis, computador e eletrodomésticos em geral; religião; assinatura de jornais e revistas.

Com relação à nacionalidade, há 264 (duzentos e sessenta e quatro) pais brasileiros e 4 (quatro) de outras nacionalidades; existem 268 (duzentos e sessenta e oito) mães brasileiras.

As ocupações profissionais dos pais compreendem ajudantes gerais, vendedores ambulantes, mestre-de-obras, tapeceiros, taxistas vigilantes e zeladores de edifícios, dentre outras. As ocupações profissionais das mães compreendem ajudante geral, cabeleireira, auxiliar de limpeza, operária, vendedoras, empregadas domésticas, dentre outras.

A renda familiar varia de 1 (Um) Salário Mínimo (09), de 1 a 3 Salários Mínimos (43), mais de 3 Salários Mínimos (63).

As famílias residem em casas alugadas (109), cedidas (13), invadidas (03). Segundo informações do coordenador pedagógico, existem alunos que moram em cortiços, favelas e abrigos. Não há informação sobre o número de alunos que moram nesses tipos de habitações.

Dos 268 pais e mães que responderam aos questionários, 90 possuem automóveis, 67 contam com computadores em suas casas, 131 possuem forno microondas e 237 têm geladeira.

Na caracterização da clientela constante no Plano de Gestão Escolar, não há informações sobre a escolaridade dos pais.

No entorno da escola há um balneário da Prefeitura e um parque público, ambos utilizados como áreas de lazer pelos moradores da região, inclusive os seus alunos.

As dependências da escola compreendem: salas de aula (10), sala de professores (01), sala para copiadora (01), sala de informática (01), sala de vídeo (01), sala de educação física (01), sala de arquivo (01), sala de direção (01), sala de vice-direção (01), sala de coordenação (01), secretaria (01), biblioteca (01), laboratório (01), cozinha (01), despensa (01), área livre (01), quadra coberta (01), cantina (01), almoxarifado (01), sanitários internos (02), sanitários externos (02), zeladoria.

A sala de informática é utilizada por alguns professores, geralmente para obterem informações relacionadas à sua disciplina. A utilização pelos alunos não é regular. Normalmente se dá quando é preciso obter dados para os trabalhos escolares.

A biblioteca não conta com funcionários para organizá-la e divulgar o seu acervo. Normalmente permanece fechada, a menos que algum professor demonstre interesse em utilizá-la. O acervo conta, sobretudo, com livros didáticos e da literatura nacional, muito embora não se saiba o total de livros disponíveis. Não há periódicos de nenhuma espécie.

O laboratório encontra-se desativado, sendo utilizado como depósito de materiais.

As classes de alunos são distribuídas da seguinte maneira: no período da manhã: 5ª série (2), 6ª série (1), 7ª série (1), 8ª série (2), totalizando 6 (seis) classes e 270 (duzentos e setenta) alunos. No período da tarde: 5ª série (2), 6ª série (2), 7ª série (2), 8ª série (1), totalizando 7 (sete) classes e 315 (trezentos e quinze alunos). No período noturno há 10 (dez) salas do curso supletivo, sendo 2 (duas) classes de 5ª série, 2 (duas) classes de 6ª série, 3 (três) classes de 7ª série e 3 (três) classes de 8ª série, totalizando 10 (dez) classes e 450 (quatrocentos e cinqüenta) alunos. As classes dos três períodos totalizam 1035 (um mil e trinta e cinco alunos), sendo a freqüência maior no período noturno.

Dentre as alunas (485), há 2 (duas) mães. Não há dados sobre paternidade dentre os alunos. Também não consta nenhum programa educativo, em âmbito escolar, para prevenir a gravidez de suas alunas. Esses dados estão em desacordo com a Proposta Pedagógica da Escola – 2003 –, que preconiza, dentre outros aspectos, “mostrar os problemas da adolescência”.

QUADRO 1: Caracterização dos professores¹

Os 3 (três) professores estão na faixa etária dos 30 a 35 anos (Marina, Luciana e André).

O menor tempo de magistério é de 5 anos (Marina) e o maior é de 13 anos (Luciana). Todos os professores lecionam para alunos de 5ª a 8ª séries.

A média de aulas ministradas na escola pesquisada é de 20 por semana. Em outras escolas, o número de aulas varia entre 10 (Luciana) e 18 (Marina) por semana.

Os professores são leitores de jornais e livros. Todos participam de atividades culturais, como cinema, teatro e visita a museus. Assistem TV, privilegiando programações como telenovelas, programas humorísticos, telejornais, entrevistas e shows.

Do Plano de Gestão Escolar, documento em que constam dados sobre a clientela da escola e o Projeto Político Pedagógico, dois professores conhecem apenas o PPP (Marina e André) e uma desconhece o Plano em sua totalidade, o que dificulta a sua utilização para referenciar e integrar as ações pedagógicas, dando-lhes maior coerência e significação em relação ao conjunto (Nóvoa, 1991).

Os professores nunca estudaram a teoria de desenvolvimento de Henri Wallon antes do presente estudo.

O coordenador pedagógico permanece na escola em período integral (manhã e tarde) e afirma conhecer o Plano de Gestão Escolar em sua totalidade. Não teve contato anterior com a teoria walloniana.

O início das atividades se deu na segunda semana, após apresentação do pesquisador na semana anterior, com o registro dos professores a respeito dos fatores que afetam a aprendizagem dos alunos. O pesquisador fez a seguinte pergunta: quais os fatores que afetam a aprendizagem do aluno? As respostas, organizadas em três categorias, indicaram os seguintes fatores: a) fatores que dependem diretamente dos professores: conteúdo, metodologia, falta de motivação, indisciplina, desatenção e desinteresse; b) fatores que não dependem exclusivamente dos professores: baixa auto-estima; ausência de ideais, de bons modelos e de perspectiva de futuro; desorganização pessoal; c) fatores que não dependem dos professores: problemas na estrutura escolar; recursos materiais da escola; desestrutura familiar; valores veiculados pela mídia.

A devolutiva das respostas organizadas em categorias ocorreu na semana seguinte e suscitou discussões sobre os fatores indicados pelo grupo. Tais discussões se deram no sentido de ressaltar as limitações dos professores diante de questões que, apesar de afetarem o trabalho docente, estão fora do seu controle (ex: estrutura escolar, desestrutura familiar, valores veiculados pela mídia). Os fatores que, de acordo com a categorização realizada pelo pesquisador, diziam respeito mais diretamente ao professor (conteúdo, metodologia, motivação, indisciplina, desatenção, desinteresse) tendiam a ser tratados pelos professores como questões mais ligadas aos alunos.

O exercício proposto apresentava dois objetivos: primeiramente, favorecer a participação dos professores mediante a indicação de problemas relevantes para a sua prática. Em segundo lugar, selecionar um problema que, dentre os indicados pelos professores, fosse passível de interpretação e orientação segundo a teoria de desenvolvimento de Henri Wallon. Nesse sentido, o pesquisador sugeriu, e os professores aquiesceram, um estudo mais aprofundado sobre a falta de interesse dos alunos pelas disciplinas, visto que este tema, além de ter sido indicado pelos professores, constitui um dos maiores desafios da prática docente e relaciona-se estritamente com o conhecimento do aluno concreto.

A falta de interesse dos alunos consistia, portanto, num tema nuclear cujo estudo poderia incrementar a cultura psicológica dos professores e, desse modo, favorecer o ajuste do ensino às necessidades e características dos alunos. Ademais, o baixo rendimento dos alunos na avaliação do SARESP, associado ao índice significativo de absenteísmo, corroborava a importância do tema.

Na quarta semana, um segundo exercício foi proposto pelo pesquisador: os professores descreveram e analisaram situações nas quais a falta de interesse dos alunos esteve em evidência.

O referido exercício tinha dois objetivos: situar o tema emergente e captar o sentido das diferentes análises. Assim, à recusa do aluno em participar do jogo de estafeta, na aula de Educação Física, a professora explica, quando indagada pelo pesquisador, pelo medo de ele errar e expor-se aos colegas, o que seria motivo de vergonha. Esta análise sugere uma habilidade de observação da professora e, ao mesmo tempo, sensibilidade na sua interpretação (Marina). Entretanto, o comportamento do aluno não manifestava, necessariamente, a falta de interesse pelo jogo, senão um meio de evitar o sentimento de vergonha que adviria de um possível erro.

Em Educação Artística, a dispersão dos alunos na aula em que houve apresentação do vídeo sobre o Cubismo, pode ter tido como causas, segundo a professora quando indagada pelo pesquisador, a idade e o conteúdo do filme (Luciana). Essa hipótese sugere um desacordo entre o conteúdo proposto e os de interesse dos alunos, de modo que, nessas condições, a aula sobre o Cubismo pouco contribuiu para desenvolver a atitude de orientação.

Em História, à mera descrição dos alunos de figuras apresentadas, sem que tivessem conseguido realizar inferências ou estabelecer nexos com outros conteúdos, o professor interpreta como uma tendência ao imediatismo (André).

A partir das análises dos professores, o pesquisador pôde inferir os conteúdos da teoria que mereciam ser introduzidos a eles, visto que tais conteúdos poderiam acrescentar subsídios às suas análises, bem como oferecer alternativas às suas interpretações. Ademais, os conteúdos teóricos visavam favorecer uma visão geral do desenvolvimento, uma vez que o problema do interesse não poderia, no contexto da teoria walloniana, ser entendido de modo isolado.

Foram selecionados os seguintes conceitos e idéias da teoria: a mútua relação entre o fator biológico e o fator social para o desenvolvimento; a visão multidimensional do desenvolvimento: conjuntos motor, afetivo, cognitivo e pessoa; a organização do processo de desenvolvimento em estágios, os quais apresentam comportamentos típicos, indicativos das possibilidades e necessidades evolutivas; as leis de desenvolvimento; a escola e o grupo como fatores do desenvolvimento; as funções implicadas na atenção; as demandas da prática pedagógica: conhecimento do aluno concreto, ou seja, do estágio evolutivo em que se encontra e do meio em que vive, a observação das reações do aluno às atividades escolares; análise das aptidões implicadas nas disciplinas; a diversificação das atividades; o interesse.

Na quinta semana, o pesquisador efetuou a devolutiva junto ao grupo de professores, compartilhando com eles os resultados do segundo exercício.

Na sexta semana iniciamos a introdução dos elementos teóricos mediante o estudo de dois textos. O primeiro texto, redigido pelo pesquisador, introduziu os conceitos e idéias da teoria que foram selecionados pelo pesquisador com base no segundo exercício. Foram necessárias sete sessões de estudo para o referido texto, todas realizadas no horário do HTPC, sempre no laboratório de informática. Em todas as sessões, a leitura era feita em voz alta pelo pesquisador ou por um dos professores e as idéias contidas em cada parágrafo eram comentadas, discutidas, exemplificadas.

Após a leitura do texto, as sessões eram finalizadas com os registros escritos e individuais dos professores, em fichas apropriadas, que respondiam às seguintes questões: “O que aprendi hoje? Do que aprendi, o que posso utilizar na minha prática docente? O que desejo aprofundar ou esclarecer?”. Tais registros eram solicitados pelo pesquisador com a intenção de acompanhar o processo de apreensão do conteúdo teórico.

Finalizadas as sessões de estudo do primeiro texto (7), seguiram-se outras 3 (três) nas quais o pesquisador conduziu aulas expositivas com o objetivo de retomar determinadas categorias wallonianas presentes no texto – conceito e critérios de formação de grupo; diversificação das atividades; análise das aptidões exigidas e exercitadas pela disciplina; observação das reações verbais e não-verbais dos alunos. E, por solicitação de uma professora participante, o pesquisador explicou os estágios do personalismo e categorial. O atendimento dessa solicitação justificou-se à medida que a professora alegou necessidade de ter uma visão geral dos estágios de desenvolvimento. Uma vez que, nessas três últimas sessões, o pesquisador excedeu o horário previsto para o término, aproximando-se do início das aulas vespertinas, e considerando que os estágios em pauta não correspondiam ao dos alunos da escola, foram dispensados os registros dos professores para fim de análise.

O segundo texto, de Der e Ferrari (2000), trata especificamente do estágio da puberdade e da adolescência. Por meio do referido texto, o pesquisador pretendeu introduzir referenciais teóricos específicos sobre o estágio de desenvolvimento no qual se encontravam os alunos dos professores participantes.

O estudo do segundo texto foi iniciado na própria escola, mas após a segunda sessão houve o encerramento do ano letivo. Os professores se dispuseram a continuar a leitura e os registros em suas casas, individualmente, no período de férias escolares, entregando-os ao pesquisador no início do ano letivo seguinte. Na escola foi possível realizar apenas duas sessões de leitura com os respectivos registros. Desse modo, juntamente com o ano letivo, encerrou-se também o processo de estudo. Com relação ao presente texto, o pesquisador solicitou aos professores responderem a seguinte questão: “Quais idéias do texto sobre a puberdade e adolescência são úteis para você entender melhor os seus alunos? Se possível, exemplifique.”

Durante as sessões de estudo, os professores solicitavam esclarecimentos sobre idéias ou conceitos que lhes permaneciam confusos. Também davam exemplos de casos ou situações, internas e externas à escola, a fim de estabelecer relações com o conteúdo teórico. Com esse procedimento, não era possível estabelecer a priori o número de parágrafos a serem lidos em cada sessão, já que cada um apresentava certas dificuldades ou suscitava discussões cujo tempo de duração não podia ser rigorosamente controlado sem prejudicar o processo de apropriação da teoria, levando em conta o ritmo do grupo.

Ao início de cada sessão, o pesquisador comentava as respostas registradas nos protocolos da sessão anterior, tendo em vista a retomada do assunto e a prestação de novos esclarecimentos, quando solicitados. Já ao término das sessões, o pesquisador anotava no seu “Diário de Bordo”, os casos e situações expostos pelos professores, o que contribuiu significativamente para a análise posterior dos protocolos.

As respostas relativas aos textos teóricos foram analisadas no primeiro semestre de 2004, tendo em vista a busca de sentido das asserções dos professores (Franco, 2003). A análise focou cada participante individualmente, seguida de considerações em âmbito mais geral.

Na etapa seguinte, no primeiro semestre de 2004, os professores e o coordenador pedagógico foram entrevistados individualmente, com o objetivo de obter, com base em suas respostas, direções para o planejamento de um processo em formação continuada.

As respostas foram organizadas em categorias, inicialmente separando as respostas dos professores e do coordenador. No corpo do texto, as categorias foram integradas a fim de promover maior coesão das análises.

Na seqüência, os dados obtidos foram analisados tendo como referentes conceitos e princípios da teoria de desenvolvimento de Henri Wallon e a literatura sobre formação continuada de professores. Todos esses dados possibilitaram sugerir direções para o planejamento de um processo formativo.

Direções sugeridas para a formação continuada de professores

A presente pesquisa propôs-se a obter, por meio de encontros com professores e coordenador pedagógico de uma escola do Ensino Fundamental da rede pública do Estado de São Paulo, direções para o planejamento de um processo em formação continuada. Os encontros foram realizados no Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo – HTPC, durante o segundo semestre letivo de 2003.

A teoria de desenvolvimento de Henri Wallon forneceu conceitos e princípios valiosos para analisar os relatos dos professores sobre os seus alunos e sua prática pedagógica, assim como ofereceu direções para o planejamento em formação continuada.

Os elementos da teoria walloniana foram introduzidos por meio de dois textos: o primeiro teve a intenção de fornecer uma visão geral da teoria e o segundo, orientar um estudo mais pormenorizado sobre o estágio da puberdade e da adolescência, já que os alunos da escola pesquisada encontram-se neste estágio. À leitura dos textos seguiram-se, por solicitação dos professores e com o objetivo de ampliar a visão sobre o processo de desenvolvimento, aulas expositivas sobre os estágios do personalismo e categorial, inicialmente não previstas no planejamento do pesquisador. Vale ressaltar que nenhum dos participantes havia estudado a teoria de desenvolvimento de Henri Wallon anteriormente.

Considerações em relação ao primeiro texto

Os professores iam relatando por escrito, ao término de cada sessão, o que aprenderam, o que podiam aplicar da teoria e o que desejavam aprofundar ou esclarecer. O coordenador pedagógico não respondeu às questões.

As respostas às questões forneceram elementos para o pesquisador regular a condução do processo de estudo, à medida que expressavam necessidades de clareza e / ou aprofundamento conceitual, assim como davam indícios dos componentes da teoria que estavam sendo incorporados (ou havia a intenção de) à prática pedagógica.

No primeiro grupo de respostas, referentes ao que foi aprendido da teoria, foram notórias as afirmações relativas:

Essas respostas sugerem a seguinte direção para a formação continuada de professores:

No segundo grupo de respostas, referentes à aplicação da teoria, destacaram-se as seguintes afirmações:

Essas respostas sugerem a seguinte direção para a formação continuada de professores:

No terceiro grupo de respostas, referentes aos esclarecimentos ou aprofundamento teórico, as afirmações mostraram duas tendências: a primeira apresentou um teor predominantemente teórico:

Essas respostas expressaram a necessidade de clareza conceitual, o que se faz necessário para uma melhor apropriação da teoria.

A segunda tendência apresentou um teor predominantemente prático:

Essas respostas expressaram a expectativa dos professores para utilizarem-se da teoria no seu trabalho em sala de aula, a fim de analisar e orientar as ações que desenvolvem. Cabe considerar, porém, que o atendimento dessa expectativa demanda continuidade dos estudos, tendo em vista um maior aprofundamento teórico e esclarecimentos conceituais.

Os professores relataram casos que exemplificavam as dificuldades enfrentadas no desenvolvimento das atividades e na interação com os alunos durante essas atividades. Esses relatos eram objeto de análise teórica, mostrando-se úteis ao indicarem a articulação entre a teoria e diferentes situações na sala de aula. Por sua vez, o pesquisador referiu-se a filmes, como Cidade de Deus e Cinema Paradiso, com o propósito de exemplificar, respectivamente, as escolhas de grupos sociais feitas pelos jovens e a exacerbação da emoção na sala de aula, vindo a facilitar o entendimento dessas idéias. Desse modo, vale destacar a utilidade dos relatos de casos e dos exemplos trazidos pelos professores, assim como o confronto com outras situações nem sempre ligadas à escola, para exercitar análises e favorecer a apropriação da teoria. Essas considerações possibilitam sugerir as seguintes direções para a formação continuada de professores:

Considerações em relação ao segundo texto teórico

As respostas ao segundo texto teórico, “O estágio da puberdade e da adolescência”, mostraram diferenças significativas na precisão das análises e na quantidade de exemplos. A professora de Educação Física estabeleceu relações mais precisas entre as proposições teóricas e os exemplos dados por ela, o que reiterou a utilização da teoria para dar significação às experiências docentes e aos comportamentos dos alunos. Por outro lado, os professores de Educação Artística e de História apresentaram dificuldade para utilizar a teoria com maior domínio, a qual foi expressa na imprecisão e ausência de relações.

Dentre os possíveis fatores que influíram na precisão das respostas dos professores referentes ao estágio da puberdade e da adolescência, enfatizamos as particularidades disciplinares e a prática de estudos. Formar equipes, estabelecer regras e observar as reações corporais dos alunos são habilidades que se destacam dentre as idéias de Wallon e são exigências que se fazem mais claramente na Educação Física, dada a natureza dessa disciplina. Ademais, o estudo regular em outra unidade escolar, associada ao gosto pelos estudos, podem explicar as análises mais precisas. Tais particularidades sugerem a conveniência de se levar em conta, nos processos de formação continuada, os diferentes repertórios de cada professor – formação, valores, experiências profissionais – indicativos de suas possibilidades e necessidades de aprendizagem.

As considerações sugerem a seguinte direção para a formação continuada de professores:

Cabe considerar que o encerramento do ano letivo exigiu a leitura individualizada do segundo texto, o que influiu negativamente na apropriação da teoria: as relações imprecisas e as repetições das idéias contrastaram com as respostas quando da leitura em grupo, antes do encerramento do ano letivo. Por hipótese, os professores sentiram falta das discussões, dos esclarecimentos ocorridos no estudo em grupo e da troca de experiências, o que reitera a relevância do trabalho coletivo nos processos de formação continuada, conforme avaliação dos professores.

Com base nas considerações acima, pode-se sugerir a seguinte direção para a formação continuada de professores:

Considerações em relação às respostas, à teoria e à literatura

À medida que a teoria vai sendo apropriada pelos professores, torna-se paulatinamente mais um componente do trabalho docente, mostrando-se útil para analisar o comportamento do aluno e orientar as atividades escolares. Esse processo vai ao encontro da proposição de Tardif (2002), segundo a qual a apropriação do conhecimento científico acompanha as mudanças do discurso e da prática dos professores: “Mudou no sentido assim ... um pouquinho que deu pra gente pegar nos estudos, nos textos, quando você trouxe por faixa etária (...) saber melhor a característica da criança e poder explorar melhor. Então, na hora de escolher um jogo, ou quando eu determino um objetivo, quais as estratégias que eu vou estar usando” .

Uma das idéias fundamentais da teoria walloniana refere-se à interação dos fatores biológicos e sociais para o desenvolvimento humano, sem a preponderância de um sobre o outro. A escola, sendo um dos componentes sociais, deve promover o desenvolvimento do aluno. Nesta perspectiva, cabe ao professor levar em conta, no planejamento das atividades e na sua realização, as dimensões, motora, afetiva e cognitiva.

Ao professor também cabe considerar cada aluno em sua individualidade, com as suas preferências, possibilidades e necessidades, de modo que o ensino possa ajustar-se a tais particularidades. Essas proposições apresentam implicações para o processo ensino-aprendizagem e, conseqüentemente, para a formação continuada, tais como:

O conhecimento sobre o aluno concreto:

Com relação ao conhecimento do aluno concreto, indispensável ao planejamento pedagógico, as respostas dos professores indicaram lacunas importantes sobretudo no que diz respeito às características dos estágios de desenvolvimento e ao meio em que vivem os seus alunos. Daí a relevância de se introduzir, nos processos de formação continuada, subsídios da Psicológica e da Sociologia, assim como diferentes formas de registro dos dados da observação, tornando-os disponíveis para o planejamento pedagógico e para estudos posteriores.

Todas as habilidades mencionadas são relevantes do ponto de vista da teoria e, a julgar pelas respostas dos professores, correspondem a dificuldades de sua prática pedagógica. Por essa razão, a inclusão de tais habilidades no planejamento de formação continuada de professores pode ser uma condição para o desenvolvimento ou aprimoramento da prática pedagógica.

A teoria walloniana refere-se ao papel do professor como um profissional responsável pelo desenvolvimento intelectual, moral e motor de seus alunos e, para isso, o seu interesse deve estender-se para além dos limites da escola, por meio do conhecimento das condições materiais e sociais de cada um e da análise das características do funcionamento da sociedade onde seus alunos irão atuar como profissionais e cidadãos partícipes.

Ao confrontar a proposição teórica sobre o papel do professor com as respostas dos professores, verifica-se um descompasso entre as suas afirmações, tais como “formar cidadãos” e “discípulos”, “participar positiva ou negativamente da vida de outra pessoa”, e o pouco conhecimento sobre o aluno concreto, particularmente sobre as suas condições materiais e sociais de existência. Igualmente relevante é a ausência de uma prática pedagógica que relacione os conteúdos disciplinares com as questões econômicas e sociais, de modo que o ensino possa favorecer uma efetiva participação social dos alunos, quando adultos.

As questões relacionadas ao papel do professor indicam a relevância de serem explicitadas a sua natureza e sua significação, vindo a favorecer o desenvolvimento da atitude de orientação que organiza e direciona a atividade docente. Vale enfatizar que o desenvolvimento da atitude docente não pode prescindir das experiências na sala de aula, o que implica na observação e na análise dos dados obtidos.

As considerações acima sugerem as seguintes direções para a formação continuada de professores:

A teoria walloniana sugere que a formação do professor não pode restringir-se aos livros, mas deve privilegiar as experiências que ele próprio pode realizar. Essa proposição, juntamente com as respostas dos professores, convergem no sentido de privilegiar as experiências educacionais em situações concretas, sempre referenciadas na teoria. São por intermédio dessas experiências que eles introduzem mudanças na sala de aula e, ao introduzi-las, vão desenvolvendo progressivamente as habilidades implicadas no ajuste do ensino aos alunos, adquirindo mais conhecimento, maior autonomia e refinando as suas análises sobre a prática pedagógica. Ademais, ao realizar tais experiências, os professores podem extrair princípios proveitosos para o processo ensino-aprendizagem. Essas considerações sugerem a seguinte direção para a formação continuada de professores:

É preciso que as experiências educacionais sejam compartilhadas e discutidas pelos professores, tendo em vista o engajamento de todos no desenvolvimento dos alunos. Por decorrência, também se faz necessário o planejamento de atividades integradas, as quais expressem o Projeto Político Pedagógico da escola, o qual faz parte do Plano de Gestão Escolar (Nóvoa, 1989).

A relevância do trabalho coletivo sugere que o grupo, em si mesmo, seja visto como uma necessidade de aprendizagem a ser considerada na formação continuada de professores, visando ao desempenho do papel de cada um para a concretização dos objetivos estabelecidos pelo conjunto, assim como o desenvolvimento dos sentimentos de responsabilidade e de solidariedade, a troca de experiência e a condução dos conflitos emergentes. Daí a seguinte sugestão para a formação continuada de professores:

A aprendizagem referente ao trabalho coletivo também diz respeito à coordenação pedagógica: trata-se de desenvolver habilidade para formar e conduzir grupos de professores, cuidando para manter uma atmosfera afetiva confortável para dar uma boa orientação aos conflitos emergentes. Essas exigências expressam uma das condições para realizar processos de estudos e experiências educacionais mais proveitosos.

Os fenômenos de resistência que surgiram durante os encontros – como a recusa de alguns professores em admitir que o trabalho em grupo de alunos deve ser um objetivo pedagógico, ou a valorização excessiva da prática em detrimento da teoria –, reiteram a necessidade de uma coordenação pedagógica capaz de dar uma boa orientação aos conflitos emergentes: trata-se de uma condição para ensejar processos mais efetivos de estudo e de mudanças na prática pedagógica.

Consideramos as reuniões pedagógicas – HTPC – um complemento da sala de aula: são nessas reuniões que os professores podem analisar as informações provenientes de sua prática e buscar os subsídios teóricos para explicá-las ou fundamentá-las, vindo a desenvolver, desse modo, a atitude investigativa. Neste sentido, o HTPC representa, no contexto atual, uma das condições materiais a serem aproveitadas para que se concretizem processos formativos que possam articular a teoria e a prática.

Nas reuniões pedagógicas, é desejável que os professores sejam agrupados segundo as classes de alunos pelos quais são responsáveis, obtendo-se assim melhores condições para analisar cada aluno individualmente e toda a classe como um todo: as suas necessidades de desenvolvimento, as suas reações às atividades propostas, os seus interesses. É também desejável que os temas culturais mais amplos, que ultrapassam o domínio disciplinar, tenham vez na pauta dessas reuniões como parte da inserção cultural dos professores.

A universidade pode contribuir para a concretização das experiências educacionais por meio da participação regular dos seus representantes nas reuniões pedagógicas, vindo a tomar parte do seu planejamento, quando solicitados, juntamente com os professores, coordenadores pedagógicos e diretores, como também selecionando e introduzindo textos teóricos, orientados para as especialidades, com a intenção de que os professores se apropriem da teoria e obtenham, por conseguinte, maior grau de autonomia (Tardif, 2002: Mizukami, 2002).

Das proposições acima resulta a relevância de uma administração escolar que possa garantir a continuidade dos processos formativos e a participação regular de todos os professores, evitando as dispersões decorrentes das atividades paralelas ou de assuntos alheios à sua finalidade. Esses aspectos não foram satisfatoriamente atendidos no decorrer desta pesquisa.

Não menos importante é uma coordenação pedagógica capaz de articular os grupos de professores e de ligar os vários grupos existentes no contexto escolar, favorecendo a coerência das ações desenvolvidas. Continuidade dos processos formativos, participação efetiva do conjunto de professores, integração das ações pedagógicas: são condições que, a julgar pelas respostas dos professores e pela literatura especializada, favorecem maior efetividade desses processos, uma vez que atendem às condições necessárias para completar as transformações em curso.

Com base nas considerações acima, são sugeridas as seguintes direções para a formação continuada de professores:

As direções sugeridas para a formação continuada de professores deste estudo são coerentes com as atuais propostas nesta área, tais como: realizar experiências educacionais na sala de aula; privilegiar o trabalho coletivo de professores; articular uma formação teórica e prática; integrar representantes da Universidade na construção do conhecimento; explicitar os valores profissionais; garantir a continuidade dos processos formativos. As direções sugeridas harmonizam-se também com a formação política dos professores, dada a relevância de considerarem, além das questões morais implicadas na sua prática (o que ensinar, para quem e para que?), os fatos políticos, econômicos e sociais. (Almeida, 2004; Mizukami et al, 2002; Miranda, 2002; Geraldi, Messias e Guerra, 2001; Nóvoa, 1991; Tavares, 1991; Kramer, 1989; Rockwell e Mercado, 1988; Wallon, 1975; Mialeret, 1974).

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1. Informações fornecidas pelos professores participantes da pesquisa. Regresar al texto




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