Contribuições da Teoria Social Cognitiva para o enfrentamento de questões do cotidiano: o caso da mídia

 

Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

Doutora em Educação

 

 

Resumo  

Este artigo tem como objetivo apresentar e problematizar contribuições da Teoria Social Cognitiva, de Albert Bandura, que fundamentam iniciativas midiáticas no campo do entretenimento-educação. O texto situa o leitor sobre a articulação teoria social cognitiva e o campo do entretenimento-educação mostrando que esta aproximação tem mais de 20 anos. Em seguida descreve um projeto específico – Taru – desenvolvido com suporte da teoria, embora não só dela. Taru era o nome da protagonista central de uma rádio-novela semanal veiculada na India entre fevereiro de 2002 a fevereiro de 2003. Treze personagens faziam parte do núcleo central da trama que se desenrolava em torno de Taru, caracterizada como uma jovem com estudo, idealista, inteligente e gentil que trabalhava pelo empoderamento das mulheres do meio rural. No desenvolvimento dos programas Taru funcionava como o modelo positivo para gênero e igualdade entre castas. Na sequência das informações sobre o projeto Taru, seguem esclarecimentos sobre a presença da teoria no desenho dos programas midiáticos, para depois finalizar com considerações gerais sobre possibilidades de exploração de outros caminhos em temáticas de interesse da América Latina.

 

Resumen

Este artículo tiene como objetivo presentar y discutir las contribuciones de la Teoría Social Cognitiva de Albert Bandura, que fundamentan las iniciativas de los medios de comunicación en el ámbito de la educación-entretenimiento. El texto pone al lector en la articulación de la teoría cognitiva social y el ámbito de la educación-entretenimiento que muestra que este enfoque tiene más de 20 años. A continuación se describe un proyecto específico - Taru - desarrollado con el apoyo de la teoría, aunque no la suya. Taru era el nombre de la protagonista central de una telenovela semanal de radio transmitido en la India entre febrero de 2002 y febrero de 2003.Trece personajes formaban parte del núcleo de la trama que se desarrolló en torno a Taru, que se caracteriza como un estudio con el joven, idealista, inteligente y amable que trabajaba para el empoderamiento de las mujeres rurales. Taru en el desarrollo de los programas funcionado como modelo positivo para la igualdad de género y de casta. Después de la información sobre el proyecto Taru, previa aclaración de la presencia de la teoría en el diseño de programas de medios de comunicación, y luego concluir con consideraciones generales sobre las posibilidades de explorar otras vías de interés por los temas de América Latina.

 

Abstract

This article aims to present and discuss contributions of the Social Cognitive Theory ( Albert Bandura) that give support to media initiatives in the field of entertainment-education. The text puts the reader on the joint social cognitive theory and the field of entertainment-education showing that this approach has over 20 years. Then describes a specific project - Taru - developed with support of the theory, though not her own. Taru was the name of the central protagonist of a radio soap opera weekly conveyed in India between February 2002 and February 2003. Thirteen characters were part of the core of the plot that unfolded around Taru, characterized as a study with young, idealistic, intelligent and kind who worked for the empowerment of rural women. Taru in developing the programs functioned as the positive model for gender and caste equality. After information about the project Taru, following clarification of the presence of theory in the design of media programs, and then conclude with general considerations about possibilities of exploring other avenues of interest in themes of Latin America.


 

O objetivo deste ensaio é apresentar e problematizar contribuições da Teoria Social Cognitiva, de Albert Bandura, que fundamentam iniciativas midiáticas no campo do entretenimento-educação, buscando favorecer mudanças sociais no cotidiano de seus assistentes.

            Para apresentar as iniciativas veiculadas pela mídia, relacionadas com a TSC, vamos nos guiar, ainda que não exclusivamente, pelos relatos contidos no livro Entertainment-Education and Social Change (Entretenimento-Educação e Mudança Social), organizado por SINGHAL, CODY, ROGERS, SABIDO (2004). Vale o destaque de que o livro contém experiências advindas de diferentes modelos.

            Poindexter (2004) traça a história do Entretenimento-Educação entre 1958 e 2000. Conta o autor suas experiências de trabalho na mídia, mas para o foco que queremos dar a este trabalho o destaque a ser dado no relato da história começa quando ele ingressa como diretor da Population Communication Center em 1970 e, nesta função, quando de seu encontro com o mexicano Miguel Sabido, figura central na inserção da teoria social cognitiva no cenário da mídia. Conta o autor que em 1977 quando em visita a rede de televisão TELEVISA foi introduzido a Sabido que, durante uma exposição de três horas sobre a forma como trabalhava, apresentou os modelos teóricos que embasavam seu trabalho, entre eles, a Teoria da Aprendizagem Social de Bandura (teoria que em 1986 foi renomeada como Teoria Social Cognitiva).

            Sabido (2004) menciona que em meados da década de 1970 foi a universidade de Stanford conversar com Bandura sobre as teorias desenvolvidas por ambos, Bandura (2006) também relata este encontro. Entretanto, vale comentar que Sabido, em sua explanação sobre seu modo de trabalhar informa ter inspiração também em outros autores (SABIDO, 2004). Certamente o encontro de Sabido e Bandura na década de 1970 foi o início de um eixo de desenvolvimento bastante frutífero, que se fortaleceu quando somado ao esforço de Poindexter em criar condições viabilizadoras da difusão do trabalho dos dois primeiros. É então, pelo encontro de Sabido, Bandura e Poindexter e de suas perspectivas diferenciadas que programas de entretenimento-educação contemplando a teoria social cognitiva ganharam força.

Retiramos de Azzi (2010, prelo) a descrição sobre os modelos aqui referidos

  O desenho dos dramas aqui referenciados foi estruturado a partir da articulação de três componentes: o modelo teórico da Teoria Social Cognitiva que especifica os determinantes psicossociais para mudança e os mecanismos pelos quais eles produzem seus efeitos, um modelo de tradução e implementação dos postulados teóricos em um modelo operativo criativo e um modelo de difusão social que promove a adoção de programas psicossociais nos diversos cenários. O modelo de tradução e implementação foi coordenado por Miguel Sabido e o de difusão social contou com parceria entre a Population Communications Internacional (PCI) e a Population Media Center (PMC), ambas organizações não governamentais que trabalham pelo bem-estar das populações e pela defesa dos direitos humanos.

 

No texto de Sood, Menard e Witte (2004) podemos encontrar análise sobre um conjunto de artigos publicados a respeitos de programas de entretenimento-educação, discussões sobre seus desenhos e estratégias de acompanhamento e avaliação. O Quadro 1 apresenta informações selecionadas sobre os programas de Entretenimento-Educação apresentados por Sood, Menard e Witte (2004, constantes às páginas 122-123), a partir de artigos publicados divulgando elementos dos programas. Os destaques apresentados referem-se aos programas que tiveram, ainda que não exclusivamente, apoio em constructos da Teoria Social Cognitiva.  Recortamos informações específicas do quadro original, que tem em seu conjunto informações sobre autoria dos artigos que discutem os projetos ali destacados, ano de exibição, meio e formato do programa, país de veiculação e teorias usadas no desenho ou avaliação do programa. Vale destacar que 23 programas estão relacionados no quadro original, dentre eles, 13 estão mencionados abaixo por fazerem referência a pelo menos um constructo da perspectiva banduriana.

 

Quadro 1 - Síntese com características dos programas de Entretenimento-Educação

 

 

Formato

Ano

Menções sobre o aporte teórico

1

Televisão

1984-85

Teoria da Aprendizagem Social

2

Televisão, rádio e outro

1985-1988

Teoria da Aprendizagem Social

3

Televisão

1969-1971

Teoria da Aprendizagem Social

4

Computador

1994-...em 2004,ainda estava ativo

Autoeficácia

5

Televisão

1992-1993

Teoria da Aprendizagem Social

6

Televisão, rádio e música

1993

Teoria da Aprendizagem Social

7

Rádio

1996-1997

Autoeficácia e eficácia coletiva

8

Rádio

1993-1995

Teoria da Aprendizagem Social

9

Rádio

1995-1997

Teoria da Aprendizagem Social

10

Rádio

1996-1997

Teoria da Aprendizagem Social

Eficácia coletiva

11

Rádio

1993-1995

Teoria da Aprendizagem Social

12

Rádio

Só menciona o início em 1995

Teoria da Aprendizagem Social

13

Rádio

1996-1997

Autoeficácia e eficácia coletiva

Fonte: Singhal, Sharma, Papa e Witte (2004)

 

A inspeção ao quadro nos permite verificar que há mais de 20 anos as idéias de Bandura iluminam a elaboração de programas de entretenimento educativo.

A seguir vamos apresentar algumas informações e considerações sobre o projeto Taru, a primeira novela que abordava conteúdos sociais, veiculada por rádio, na India. O leitor poderá encontrar outras informações, com imagens, no endereço da Population Communication Center

http://www.population.org/programs_india_taru.shtml, que representa um dos três modelos que possibilita o desenvolvimento do entretenimento educativo aqui descrito, conforme já exposto anteriormente.

 

Destaques do projeto Taru, veiculado na India

Apresentaremos a seguir um breve relato sobre o projeto Taru desenvolvido na India, para que o leitor tenha um exemplo mais detalhado do tipo de trabalho realizado com a contribuição do aporte teórico da teoria social cognitiva. Para tanto, vamos nos guiar pelas palavras de Singhal, Sharma, Papa e Witte (2004) ao longo da ilustração do projeto.

O projeto foi desenhado como, tendo como focos centrais o planejamento familiar e a alteração da condição de inferioridade feminina.

O projeto Taru, uma rádio-novela com veiculação semanal foi elaborado para 52 programas apresentados entre fevereiro de 2002 a fevereiro de 2003. Ao final de cada capítulo era apresentado um epílogo no qual eram feitas questões para que os ouvintes pensarem e responderem por escrito para a rádio. Treze personagens faziam parte do núcleo central da trama que se desenrolava em torno de Taru, uma jovem estudada que trabalhava em uma organização que oferecia serviços de saúde reprodutiva e realizava atividades de ajuda na vila onde se passava a história. Ela foi caracterizada como uma jovem idealista, inteligente e gentil que trabalhava para o empoderamento das mulheres do meio rural.  Durante o desenvolvimento dos programas Taru funcionava como o modelo positivo para gênero e igualdade entre castas.

 Também envolvido em trabalho social trabalhava com ela Shashikant, que se tornou um amigo próximo, a apoiava em suas idéias e apreciava suas características pessoais. Pertencente a uma casta inferior Shashikant sofria de discriminação na vila em que moravam.

Yashoda, a mãe da Taru a apoiava em suas atividades, mas seu irmão – Mangla – não. Ele também desdenhava a relação de amizade entre Taru e Shashikant por conta da diferença de classes entre ambos. Apoiados por Aloni Baba, um respeitado religioso da vila e por Guruji, um professor, os jovens Taru e Shashikant em suas lutas contra o casamento de crianças, promoção de diminuição do padrão familiar e a favor da educação das mulheres. Phirki Chachi é a fofoqueira da vila que incita e cria confusão.

            Dois outros enredos ao redor do núcleo central enriquecem a trama. Naresh, sua esposa Nirmala, sua irmã Ranjana, sua mãe Ramdulari e suas quatro filhas. Ramdulari insistia que a nora tenha mais uma criança, argumentando que a importância em ter um neto homem. Nirmala usava contraceptivo para evitar gravidez indesejada e ao longo da história Ramdulari foi mudando de comportamento em relação a suas netas, se tornando mais compassiva e deixando de ser inflexível com a vinda de um neto.

              O casal Neha e Kapileshwar ilustram outro contexto de mudança no perfil dos personagens. Neha, estudada, amiga e apoiadora de Taru,  enfrenta resistência de seu marido e familiares por parte do marido sobre suas iniciativas na comunidade, entre elas ensinar crianças da vila de castas inferiores. Mas Neha é persistente e fonte inspiradora de outros. Ao longo dos programas Kapileshwar, inicialmente caracterizado como chauvinista e com os valores tradicionais de indivíduos de classe superior que era vai, aos poucos mudando e passa a apoiar Neha em suas iniciativas.

            A longa exposição sobre o projeto Taru tem aqui o objetivo de permitir ao leitor conhecer os traços gerais do enredo que permitem que histórias complexas e que retratam o cotidiano possam ser visualizadas, uma vez que o entrelaçamento das histórias dos personagens ao longo de 52 capítulos é descrição desnecessária de ser resgatada.

            Enquanto os programas foram sendo exibidos pesquisas quanti e qualitativas foram sendo realizadas. A Tabela 1 destaca parte das informações constantes em tabela apresentada no texto de Singhal, Sharma, Papa e Witte (2004), sobre resultados de quadro sondagens realizadas durante a exibição de Taru. A audiência medida em uma das localidades onde Taru foi exibida indica que a mesma variou entre 10% e 15% nos períodos em que avaliações foram feitas (os períodos são os mencionados na tabela abaixo).

Os dados revelam que a audiência aos programas semanais permitia a identificação com os personagens, processo que anunciava possibilidade de que novas informações e estratégias para lidar com o cotidiano desenhando caminhos diferentes dos por eles vividos até então tinham potencial para serem captadas pelos ouvintes. A intenção de mudança comportamental pode ser vista na Tabela 1, com altos níveis de freqüência.

 

Tabela 1 – Resultados de levantamentos realizados durante a exposição dos programas Taru na India

 

Dimensão

 Medida/

Levantamento 1

N = 369

Levantamento 2

N = 457

Levantamento 3

N = 521

Levantamento 4

N = 371

Data

Abril 2002

Junho 2002

Setembro 2002

Novembro 2002

Percepção dos ouvintes sobre quão similar os personagens de Taru eram deles

 

 

30%

 

 

48%

 

 

37%

 

 

45%

Intenção dos ouvintes de mudar seu comportamento como resultado da audiência a Taru.

 

 

61%

 

 

80%

 

 

50%

 

 

83%

Fonte: Singhal, Sharma, Papa e Witte (2004)

 

Em uma das vilas em que o projeto aconteceu entrevistas foram realizadas e gravadas pós-exibição dos programas. Outra informação interessante é mencionar que vários estudos foram feitos antes da montagem dos programas, bem como durante e após o término de sua veiculação. Entre as estratégias de desenvolvimento do projeto havia a montagem de grupos de discussão sobre os assuntos abordados nos programas, uma ação favorecedora da troca de idéias e confronto de diferentes pontos de vista. Enfim, um registro cuidadoso foi feito antes, durante e após a exibição dos capítulos semanais.

Vejamos agora alguns comentários e relatos encontrados no texto de Singhal, Sharma, Papa e Witte (2004), sobre os impactos que a assistência à radio-novela fomentou .

Um exemplo dado pelos autores sobre eficácia coletiva revela que em uma das localidades que ouviu o programa, inspiradas pelo personagem Neha, uma jovem e um grupo de rapazes do grupo de ouvintes de Taru, depois de sete meses de audiência acompanhada de discussão e deliberação, iniciaram uma escola para crianças desfavorecidas. Outros exemplos são descritos e servem de evidência para os investigadores de que Taru estimulou discussões interpessoais sobre assuntos educacionais e motivou ouvintes a engajaram-se em ações coletivas para resolver problemas da comunidade. Alertam os autores, entretanto, que a mudança social raramente flui direta e imediatamente da exposição aos programas. Os resultados por eles encontrados sugerem possibilidades sinergéticas entre a mudança social e a exposição a entretenimento educativo, mas destacam a necessidade de articulação, para o caso de Taru, entre a veiculação do programa, grupos comunitários de ouvintes para debater os assuntos e os serviços de saúde disponibilizados na comunidade. A seguir transcrevemos trecho de um depoimento mencionado no capítulo e autores já mencionados.

“We listen to each episode of Taru. We then discuss the episode´s content in our listeners club.Through the medium of Taru, we are learning lots of new things, and I am trying to incorporate many of them in my life to make it better, After listening to this radio serial, we have taken decisions to wipe out the castle discrimination in our village, teach dalit (lower castle) children and to persue higher education”

Vandana Kumari, 17 anos, dado de entrevista realizada em Setembro de 2002.

 

Considerações sobre a Teoria Social Cognitiva e as mídias

A Teoria Social Cognitiva, perspectiva psicológica que representa a formulação banduriana para a compreensão do desenvolvimento e ação humanas teve, entre suas formulações iniciais o nome de Teoria da Aprendizagem Social, nomenclatura que vemos referida no quadro anteriormente apresentado. Mas, desde 1986, quando da publicação do livro Social foundations of thought and action: A social cognitive theory as idéias desenvolvidas por Bandura recebem o nome de Teoria Social Cognitiva (BANDURA, 1986).

Tem esta perspectiva um referencial teórico que postula uma visão de homem agente, que pode influenciar intencionalmente a si e aos cursos de ação de sua vida. Esta visão de indivíduo agente não o descola das determinações sociais, ao contrário, vê o individuo como ser social que vive imerso em redes de influências sociais, sendo que a agência pessoal e a estrutura social operam como co-determinantes de uma mesma estrutura causal. Trata-se, portanto, de uma abordagem interacionista que percebe o homem como produto e produtor do meio. (BANDURA, 2001A).

Em Bandura (2001b, 2004 e 2009, por exemplo) podemos verificar que os sistemas de comunicação de massa atuam por dois caminhos de influência junto aos indivíduos. Pelo primeiro, que incide diretamente sobre o indivíduo por meio da comunicação veiculada, procura-se informar, capacitar, motivar e guiar os assistentes. Pelo segundo, o caminho socialmente mediado, as influências midiáticas são usadas para guiar os participantes para redes e recursos disponíveis na comunidade que os apóie e oriente, que lhes dê suporte social, nos assuntos abordados via mídia.

Segundo Bandura (2009), a teoria social cognitiva analisa o processo de difusão social de novos padrões comportamentais como sendo constituído por três fatores: aquisição de informações sobre comportamentos inovadores, a adoção destes comportamentos inovadores e a rede social através da qual eles podem ser disseminados e suportados. O exemplo de Taru, apresentado acima, ilustra este movimento. Por meio do exemplo de Taru e outros personagens outras pessoas – na trama e na contexto real – vão adquirindo referências para comportamentos inovadores e para os quais encontram no meio social rede de suporte que possibilita sua expressão.

O processo de modelação sustenta a lógica teórica envolvida na criação dos programas e por meio dele o fortalecimento das crenças de eficácia pessoal e coletiva vão sendo trabalhados. A modelação afeta a adoção de novas práticas sociais e padrões comportamentais de várias maneiras. Instrui as pessoas sobre novas maneiras de pensar e agir, seja por demonstração ou descrição. A modelação eficaz não só cultiva competências, mas também reforça o sentido de eficácia pessoal necessário para transformar o conhecimento e habilidades em cursos de sucesso da ação.  As crenças de eficácia pessoal e coletiva são definidas, em linhas gerais, como as crenças de alguém (autoeficácia) ou de um grupo (eficácia coletiva) em sua capacidade em organizar e executar cursos de ação requeridos para produzir certas realizações. Têm papel central no exercício da agência pessoal e coletiva na medida em que afeta o comportamento e outros aspectos determinantes dele, como estabelecimento de objetivos, expectativa de resultados, percepção de barreiras etc (BANDURA, 1997).

 

Considerações finais

Esperamos ter conseguido apresentar evidencias ao leitor que mostrem que a perspectiva da teoria social cognitiva pode colaborar com o planejamento de situações midiáticas que possam configurar uma possibilidade de interferência positiva no dia a dia das pessoas, como uma possibilidade de fortalecê-las para protagonizarem ações em sua história em direções diferentes as que o curso ‘natural’ do dia a dia as conduziria, como exemplificado, por exemplo, no caso de Taru e a luta pela educação das mulheres. Há aqui um campo de possibilidades que permite pensar como explorar novas frentes de ações visando favorecer com que as pessoas atuem de forma agêntica em causas mais coletivas e socialmente relevantes.

Em outra direção, vamos fazer a interlocução com Calvino (2009), um profissional e estudioso de mídia, primeiro dele divergindo, para depois com ele concordar. Em evento sobre mídia e subjetividade realizado no Brasil em 2007, Calvino faz uma fala muito provocativa quando diz que a Psicologia já tem conhecimento demais produzido, que podemos parar de investigar, pois já sabemos muito, temos que agir, que colocar nosso conhecimento responsavelmente a serviço do desenvolvimento de sujeitos críticos (CALVINO, 2009).  Nossa divergência neste ponto se explicita na defesa que fazemos de que é preciso continuar investigando, até quando atuamos nos espaços midiáticos, há sempre perguntas que precisam de novas respostas e o conhecimento vai se ampliado, transforma nossas práticas que por sua vez gera novas investigações, enfim, um movimento dinâmico e necessário de produção de conhecimento, seja no campo da prática seja no campo da ciência. No que diz respeito à ciência, ainda que não defendamos que toda ciência precisa ser aplicada, vale destacar que é verdade que muito tem sido produzido sem que se leve em conta a diversidade cultural e social e sua complexa rede de urgências e necessidades.  

Em outro momento de sua exposição Calvino (2009) chama nossa atenção para o fato de que temos possibilidade de usar nossa potência criativa para, com recursos tecnológicos, inventar ‘outras formas de ser e de compor com o mundo, outras formas de ser sujeito e outras formas de fazer sociedade” (p. 50). Esperamos que as informações e discussões aqui privilegiadas sirvam de inspiração para que novos caminhos de interação com os recursos midiáticos possam frutificar, colocando-nos em rotas mais pró-ativas de intervenção na realidade.

Nesta direção, precisamos nos interrogar, por exemplo:

- o caminho aqui discutido pode servir como motivador para pensarmos possibilidades de interferências para além da crítica sobre as grandes redes (ação necessária, é claro)?

 - é possível explorarmos esta lógica de entretenimento para pensarmos questões atuais  da América Latina?

- quais são os temas mais urgentes?

- quais recursos podemos trabalhar?

 Os exemplos oferecidos neste texto mostram que as diferentes mídias podem ser espaço de criação e interferência emancipadora dos sujeitos individuais e coletivos, algumas delas podem ser desenvolvidas com recursos restritos, mas efetivos, como a internet. A realização de produtos mais elaborados também pode ser facilitada com projetos articulados entre diferentes áreas de conhecimento – por exemplo, psicologia, comunicação e ciências sociais, em um movimento que integre ações nos espaços formativos de ensino superior. Certamente há muitos caminhos a serem explorados.

Mas toda e qualquer contribuição que a psicologia possa realizar dependerá das escolhas políticas, de projetos a serem formulados e implementados, de ações que sejam inovadoras e que superem concepções conservadoras cujas práticas apenas favorecem a manutenção dos problemas no mesmo patamar de ocorrência. Este o maior desafio, criar formas efetivas de construção de uma sociedade justa e que viabilize o pleno estado de direito a todos. Certamente esta autora acredita que podemos encontrar apoio e sustentação para fazê-lo com o apoio da abordagem aqui privilegiada.


REFERÊNCIAS

 

AZZI, R.G. (2010) Mídias, transformações sociais e contribuições da teoria social cognitiva. Revista Psico (PUC-RS), no v41n2, prelo.

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CALVINO,M. (2009). Mídia e Psicologia: produção de subjetividade e coletividade. Mesa de abertura, 25-27, Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 364.

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA (2009). Mídia e Psicologia: produção de subjetividade e coletividade. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 364.

POINDEXTER, D.O.(2004) A history of Entertainment-Education, 1958-2000.  Em  SINGHAL, A., CODY, M.J., ROGERS, E.M., SABIDO, M. (Orgs) Entertainment-Education and Social Change. History, Research, and Practice. Mahwah:Lawrence Erlbaum Associates Publishers.

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